24.4.11

Resumo “Identidades Assassinas” de Amin Maalouf (1998) – Quinta e Última Parte

Amin Maalouf termina o livro neste capítulo a que dá o nome “Domesticar a pantera”. O fenómeno da mundialização continua a ser aprofundado e o que o autor procura agora é entender de que modo a mundialização exacerba os fenómenos identitários e de que modo poderia ela torná-los menos assassinos.

Assim, considera fundamental que cada um se possa reconhecer na mundialização e que esta não seja apenas exclusividade dos Estados Unidos. É sublinhada aqui também a premência do princípio da “reciprocidade”, ou seja, o princípio de que cada um de nós tenha de adoptar elementos de culturas mais poderosas, mas que cada um também possa ver certos elementos da sua própria cultura serem adoptados por outros países e fazerem parte do património de toda a humanidade. Apesar de não duvidar que a mundialização pode ameaçar a diversidade cultural, de línguas, de modos de vida, Maalouf tenta ver o lado positivo, afirmando que também nos dá os meios para evitar que essas perdas ocorram.

A Internet é um desses meios, como espaço igualitário, que pode ser utilizado como instrumento de liberdade (exemplo dos jornalistas. Ver artigo "Os bloggers são jornalistas?"). Maalouf refere também os instrumentos de tradução que permitem que, mesmo que o Inglês seja predominante, a diversidade de línguas se alastre (hoje ainda mais, com ferramentas de tradução muito mais desenvolvidas, com a possibilidade de falar com pessoas em qualquer parte do mundo, de assistir a vídeos no Youtube, com as redes sociais, etc).

Este ponto sobre a diversidade de línguas é alvo de especial atenção por Maalouf (não fosse ele o criador da ideia de uma língua pessoal adoptiva. Ler: “Um desafio Salutar”). Por quê dar menos atenção à diversidade de culturas do que à diversidade de espécies animais e vegetais? Diz o autor que:

“O combate pela diversidade cultural será ganho quando estivermos prontos para nos mobilizarmos intelectual, afectiva e materialmente, a favor de uma língua ameaçada de desaparecimento, com tanta convicção como a que mostramos para impedir a extinção do panda ou do rinoceronte”.

Para Maalouf, a língua é um elemento da identidade pelo menos tão importante como a religião. Quando duas comunidades têm línguas diferentes não basta a religião para as unir. Por outro lado, a língua pode ser uma aliada da religião. O que é certo é que:

“Um homem pode viver sem uma religião, mas não pode viver sem uma língua”

A diferenciá-las está também o facto de a religião ser exclusiva e de a língua não, ou seja, pode saber-se falar mais do que uma. A língua é, não só um elemento da identidade, como também meio de comunicação e, se é desejo do autor que se separe a religião da identidade, separar esta da língua não lhe parece benéfico, pois é o eixo da identidade cultural e a diversidade linguística, Maalouf considera-a como eixo de toda a diversidade.

São estas duas funções das línguas, a identitária e a comunicacional que as distinguem. Hoje, o inglês responde à segunda, mas não responde à primeira (a não ser no caso dos falantes nativos, claro). Surge então a necessidade de ir mais longe. Entre a língua identitária e a global existe um espaço. Assim, Maalouf propõe uma terceira, uma em que cada indivíduo seja especialista, uma língua do coração, uma língua adoptiva ou língua privilegiada de comunicação. Esta seria uma forma de preservar a diversidade cultural, que o autor admite exigir algum voluntarismo.

Maalouf tenta delinear uma solução para satisfazer o desejo de identidade. Dá como exemplo alguns tipos de regimes que tentaram repartir o poder pelas várias comunidades: o caso falhado do Líbano, que implementou um sistema de quotas, e os regimes ditatoriais comunistas e nacionalistas. Conclui, então, que a escolha só pode estar no quadro da democracia. Mas há democracias e democracias. Um sistema de quotas levado ao absurdo ou um sistema que não respeita senão a lei dos números podem ser ambos muito perigosos. Diz o autor que qualquer prática discriminatória pode ser perigosa, mesmo quando exercida a favor de uma comunidade que sofreu discriminações. Não só se substitui uma injustiça por outra, como se reforça o ódio e a suspeição. Enquanto o lugar de uma pessoa numa sociedade depender de uma pertença está-se a perpetuar um sistema perverso, que só aprofunda divisões:

“O único objectivo respeitável é o de lutar para que cada cidadão seja tratado como um cidadão de corpo inteiro, quaisquer que sejam as suas pertenças”.

Passa então à crítica dos sistemas baseados na decisão das maiorias, como a lei do sufrágio universal, em que cada cidadão tem uma voz nas eleições, através do voto. O problema é que este sistema, exercido num clima de crise social aguda e de propaganda racista, pode conduzir à própria abolição da democracia. Dá como exemplos o da Alemanha nazi ou o do Ruanda. Neste país, os hutus representam nove décimos da população e os tutsis cerca de um décimo. Nos massacres de 1994, o extermínio dos tutsis pelos hutus veio acompanhado de argumentos como a defesa da democracia e de eliminação de uma casta de privilegiados. Assim,

“O papel das democracias já não é o de fazer prevalecer as preferências da maioria, mas sim o de fazer respeitar os direitos dos oprimidos, mesmo contra a força dos números”.

No caso da África do Sul, a utilização do slogan “Majority Rule” não significava querer substituir um governo branco por outro negro. O desejo de homens como Nelson Mandela era o de dar a todos os cidadãos, qualquer que fosse a sua origem, os mesmos direitos políticos e a liberdade de elegerem os dirigentes de sua escolha, independentemente da sua ascendência africana, europeia, asiática ou mestiça.

No entanto, para se considerar esta possibilidade seria necessário um processo eficaz de harmonização interna, de harmonização e de maturação, que cada um dos candidatos pudesse ser julgado pelos seus próprios concidadãos pelas suas qualidades humanas e pelas suas opiniões e não pelas pertenças que herdou. Em 1998, Maalouf dizia que escusado seria referir que não nos encontrávamos ainda nesse ponto, mas que nada proibia que um dia um branco fosse presidente da África do Sul e um negro presidente dos Estados Unidos…

2 comentários:

Unknown disse...

Reactivaste este teu blogue? Devias dedicar-te mais a ele...

Inês Branco disse...

Ele nunca está totalmente desactivado. Vai é estando inactivo :) porque nem sempre tenho coisas para alimentá-lo. Mas, se calhar, em breve, vou ter. Fica atento!