18.11.07

Entrevista com André Soares, coordenador do MLS Tomar




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IB: Como surgiu esta ideia de criar um grupo do MLS em Tomar?

AS: Surge da reflexão do MLS acerca da política local. O MLS, até agora, não tinha nenhuma acção a nível local, nenhuma concelhia, nenhum grupo local. Na altura em se discutiu isto, achei que o concelho de Tomar, por ser de onde venho e por achar que é um concelho subaproveitado, propus à direcção do MLS que este fosse o concelho escolhido para arrancarmos com um projecto-piloto de política local.

IB: Como te juntaste ao MLS e porquê este interesse pela política?

AS: Estou a acabar o mestrado em Política Social e das Organizações e desenvolvo um estágio académico em Lisboa. Reparto o tempo entre Lisboa e Tomar. Conheci o MLS na imprensa nacional, através de um artigo no “Público”.

IB: O grupo de Tomar foi criado há quanto tempo?

AS: Foi criado em Junho deste ano. Estamos na fase de cativar pessoas para a equipa, a ouvir a população para saber quais são os problemas e a consultar dados estatísticos e demográficos. Nesta fase, o mais importante é construir uma equipa. A partir de Janeiro de 2008 começaremos a trabalhar num programa político.

IB: Quem é essa equipa?

AS: Temos aqueles que são ou vêm a ser membros do MLS e aqueles que são independentes, mas que querem colaborar neste projecto e que se identificam com uma política local liberal. São pessoas de Tomar, pois se queremos fazer uma lista e partir para eleições, essas pessoas terão de estar recenseadas no concelho de Tomar para poderem ser eleitas.

IB: Quando o MLS se propuser a eleições em Tomar, serás tu o candidato. Quais são os teus projectos de vida e qual uma boa proposta do MLS em Tomar?

AS: Sou eu quem está a liderar o grupo e deverei continuar durante algum tempo, no entanto, não temos um candidato definido. Estou disponível para isso. A equipa ainda está em construção, muita coisa ainda vai ser discutida.

Estou em Lisboa, mas a minha residência oficial é em Tomar. Quero manter a minha ligação ao concelho. Vou dividindo a minha vida entre Lisboa e Tomar. Hoje isto está muito facilitado com as novas tecnologias. Consigo ter informação política de Tomar quase em tempo real e julgo que não seja indispensável a minha presença lá.

IB: Como conhecedor da região de Tomar, o que pensas que o MLS poderá dar a Tomar que Tomar não tenha já ou que outros partidos não possam vir a dar?

AS: Tomar tem um potencial enorme. Tem excelentes acessibilidades, um património histórico-cultural incrível, mas está muito subdesenvolvido. Isto tem partido das políticas muito conservadoras que têm existido nos últimos anos.

IB: No que é que se caracteriza esse subdesenvolvimento?

AS: Verifica-se que na zona de Tomar existem concelhos com franco desenvolvimento, como Torres Novas, Ourém, Abrantes e Entroncamento, tanto em sentido económico, como social. Enquanto Tomar tem estado estagnado e até tem tido algum retrocesso. Na mesma medida que vão abrindo novas empresas nos concelhos limítrofes, em Tomar as empresas vão fechando. Cada vez há menos emprego qualificado em Tomar e o de baixa qualificação já está a desaparecer. A população está a ficar muito envelhecida e isto é particularmente grave, porque não se deve à saída de pessoas para ir para Lisboa, Porto ou Coimbra, mas sim para os concelhos vizinhos. Aí têm acesso a mais cultura, a melhores empregos.

IB: O que deu origem a essa paragem no desenvolvimento?

AS: O retrocesso começou no 25 de Abril. Antes disto, era um pólo industrial de importância no nosso país. A partir dali houve um “abanão”, tal como em outras partes do país e parece-me que Tomar não soube recomeçar. Ainda andamos a viver a ressaca do 25 de Abril. A cidade está muito fechada a novos investimentos, a novas pessoas, a novos projectos. Há uma super-protecção dos poderes instalados, quer económicos, quer sociais. É extremamente difícil uma média ou grande empresa entrar na economia tomarense. E isto é culpa das políticas que se têm tomado. Os projectos são boicotados não pelas pessoas que estão a vender os terrenos, mas pela Câmara Municipal, que ou não passa os alvarás ou não dá autorizações para que as empresas se instalem no concelho.

IB: Nos últimos 30 anos já passaram vários partidos pela Câmara. Todos adoptam essa política?

AS: É um fenómeno interessante, mas infeliz. Tal como na política nacional, a Câmara vai alternando entre PS e PSD, mas as políticas são muito parecidas.

IB: Não há uma alternativa?

AS: Creio que não. Os partidos, mesmo os outros, têm as mesmas pessoas desde há 10 ou 15 anos. São sempre as mesmas ideias. Por isso parece que ainda vivemos há 10 ou 15 anos atrás. Não há inovação, querer andar para a frente. Contribuem todos para esta situação.

IB: O que pensas dar a Tomar que Tomar não tenha?

AS: A estratégia do MLS terá de passar sempre por três vertentes: económica, social e ambiental.

Na vertente social, falo do património histórico-cultural. Medidas tão simples como em vez de promovermos o turismo junto do público, promovê-lo junto dos operadores turísticos. Se tivermos operadores turísticos a operar em Tomar vamos ter muito mais turismo.

IB: Mas o desenvolvimento de Tomar não passa só pelo turismo.

AS: A mesma coisa acontece em termos económicos. Não existe uma marca que venda Tomar às empresas. É tão simples como criar uma marca “Tomar Investir”. Tomar tem de ser promovido junto dos empresários e mesmo das pessoas da terra. O investimento não tem de vir de fora.

IB: Haverá algum tipo de apoio que exista nos concelhos limítrofes e que não exista em Tomar?

AS: A primeira razão para isto acontecer é o facto de nos concelhos vizinhos não haver forças de bloqueio tão fortes.

IB: Essas forças são quem?

AS: Parte claramente da Câmara e dos partidos representados na autarquia.

IB: Pensas que existe um interesse no bloqueio do desenvolvimento de Tomar?

AS: Em Tomar temos muito pequeno comércio e existe um grande “lobby” do pequeno comércio. Os autarcas não querem proteger o que é seu, querem proteger aquele “lobby”. Querem proteger o comércio tradicional a todo o custo, ainda que as pessoas vão fazer compras ao lado.

IB: Não se está a abrir as portas a outro tipo de investimento, que geraria muito mais emprego?

AS: Mesmo esse comércio, se entrassem novas empresas no panorama económico de Tomar, também se iria desenvolver. Julgo que se poderia criar um gabinete de apoio ao desenvolvimento.

IB: E se um cidadão de Tomar quiser colaborar contigo?

AS: Pode entrar em contacto comigo ou com a concelhia. Mesmo que não seja para dar a cara, é importante que as pessoas participem e dêem a sua opinião. É importante que as pessoas não vivam à margem do que se passa.

IB: Para Tomar há alguma acção prevista?

AS: Está a ser preparada uma apresentação pública, tanto do MLS, como do MLS Tomar.

Para obter mais informações sobre o MLS Tomar, poderá consultar o blog.

29.10.07

Entrevista - 6ª AG do Movimento Liberal Social

Esta entrevista foi realizada na 6ª Assembleia Geral do MLS, a dois dos membros que apresentaram moções. Primeiro, Miguel Duarte faz um resumo da sua moção sobre empreendorismo e, de seguida, Luís Humberto Teixeira apresenta a sua moção sobre o processo eleitoral.


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Sobre a moção apresentada por Luís Humberto Teixeira, poderá obter mais informações na entrevista realizada em Março deste ano. Entrevista com Luís Humberto Teixeira sobre os eleitores fantasma

Entrevista com a Juventude Liberal Social

Esta entrevista foi gravada durante a 6ª AG a alguns membros da Juventude Liberal Social.


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18.10.07

Referendo ao Tratado Europeu - Entrevista com Miguel Duarte



IB: O Movimento Liberal Social (MLS) defende a realização de um referendo à escala europeia para o novo Tratado Europeu. Qual é a diferença entre um tratado e uma constituição?

MD: A nível europeu a diferença não é muito grande. Se compararmos a actual proposta do Tratado com a anterior proposta de Constituição, a diferença é muito reduzida. Resume-se a que retiraram alguns artigos da anterior Constituição, alguns puramente simbólicos, como haver um hino e uma bandeira. A anterior Constituição era um tratado constitucional, por isso penso tratar-se de uma questão política e de palavras.

IB: A Constituição não foi já rejeitada?

MD: A Constituição não foi rejeitada. A Constituição só foi rejeitada em alguns países. Para que a Constituição entrasse em vigor era necessária a assinatura de todos os países da União Europeia. Todos tinham de aprovar a Constituição Europeia e esta foi rejeitada, em referendo, por alguns países. Por isto, parou-se o processo constitucional.

IB: O MLS é a favor da realização de um referendo para um novo Tratado Europeu ou para uma nova Constituição.

MD: O desejo do MLS era que houvesse mesmo uma Constituição.

IB: Por que não um tratado em vez de uma constituição?

MD: A palavra Constituição tem um carácter simbólico mais fundador, como uma lei básica, base daquilo que seria a União Europeia. Um tratado, em termos práticos, perde o simbolismo, mas tem o mesmo efeito.

IB: Porquê um referendo à escala europeia e não apenas nacional?

MD: Tratando-se de um tratado que é para ser implementado a nível europeu, todos os europeus deveriam poder votar sobre esta questão e, também, devido à importância que este documento tem. Setenta por cento das leis aprovadas todos os anos em Portugal emanam da União Europeia. Esta tem uma influência profunda em todo o processo legislativo a nível nacional. O mesmo é válido para os outros países. Portanto, não me parece justo que em alguns países haja referendo e noutros não, sendo os políticos a decidir. O democrático seria que houvesse, a nível europeu, um referendo.
O segundo ponto diz respeito a que, muitas vezes, quando há referendos nacionais sobre questões europeias, o referendo acaba por centrar-se em questões nacionais e não em questões europeias. Se fizermos um referendo em simultâneo com as eleições para o Parlamento Europeu e à escala europeia, o referendo será um debate europeu. Poderemos assistir a políticos europeus a pronunciar-se sobre o referendo e as discussões serão sobre temas europeus.

IB: Seria essa a melhor data para o referendo?

MD: A campanha que o MLS está a defender propõe que a data para a realização do referendo seja em simultâneo com as eleições para o Parlamento Europeu, em Junho do próximo ano.

IB: De que forma este tratado irá contribuir para o desenvolvimento da Europa, quer em termos económicos, quer em termos ambientais?

MD: A Europa já tem alguns órgãos centrais para decisão, mas estes órgãos não têm todos os poderes que deveriam ter, nem são órgãos muito democráticos. Elege-se um parlamento, mas este não tem os poderes que um parlamento normal teria. Por exemplo, o Parlamento Europeu propôs que se abolisse a actual proibição de levar líquidos nos aviões e o órgão democrático quis levantar essa proibição, mas logo de seguida a Comissão Europeia, que é um órgão pouco democrático, pois não é eleito directamente pelos cidadãos europeus, não aprovou aquilo que o Parlamento tinha já aprovado. Isto deveria acabar.

A nível internacional a Europa está enfraquecida, não tem um representante único que possa exercer a política externa da Europa e muitas das decisões não são tomadas por maioria, o que prejudica a capacidade de decisão da União Europeia. Temos de ter muitas mais decisões a nível da União Europeia que sejam tomadas por maioria, principalmente agora, em que o número de países que pertencem à União Europeia é muito elevado. Um novo tratado iria resolver todos estes temas e contribuir para dar muito mais força e capacidade de decisão à Europa.

IB: O que vai acontecer nos países onde ganhar o “Não”?

MD: Sendo um referendo à escala europeia, há um resultado global para a União Europeia. Isto deverá dizer alguma coisa aos políticos sobre se os cidadãos da União Europeia, como um todo, aprovam o referendo ou não. É evidente que haverá parciais a nível nacional. Cada país, a nível nacional, deverá tomar uma decisão sobre se deseja participar na nova União Europeia que se está a construir, ou não. Considero que um país não deve impedir o processo de construção europeia. O Reino Unido, eventualmente, diz que não a este tratado, mas toda a União Europeia não poderá ficar parada devido a um país. Se um país rejeita o tratado, esse país deverá tirar daí as suas elações e, possivelmente, terá de negociar um novo acordo com a União Europeia, que poderá ser esse país abandonar a União Europeia e ficar com um acordo especial de cooperação, por exemplo.

IB: Este referendo é consultivo e não vinculativo. Qual é a força de um referendo destes?

MD: Devido a questões legais, pois há países que proíbem a realização de referendos sobre a União Europeia, o referendo nunca poderá ter um carácter obrigatório para todos os países. Ao ser consultivo significa que não tem força legal. Em teoria, os políticos de cada país podem não seguir aquilo que o referendo determina. Mas em países democráticos, os políticos terão a obrigação moral de seguir os resultados do referendo.

IB: No caso português poderia ser feito um referendo vinculativo. Por que é que o MLS propõe a realização de um referendo consultivo?

MD: Nós estamos numa campanha internacional, cujo objectivo é a realização do referendo em todos os países. Portanto, independentemente da situação em cada país, nós propomos a realização de um referendo consultivo, por ser um referendo que se quer pan-europeu. É simplesmente para resolver questões legais. Isto não impede que os políticos em Portugal decidam que este referendo, a realizar-se, seja vinculativo.

Oiça a entrevista aqui!

European Referendum

13.9.07

Conferências "A Busca da Felicidade" na Culturgest

Felicidade na Economia

No final de Maio, aconteceram, na Culturgest, as conferências sobre a Felicidade. Fui assistir a uma. O tema, à partida, não prometia muito, mas acabou por ser muito interessante: “Felicidade na Economia”.
O objectivo era explicar a ideia de felicidade na teoria dos modelos económicos e no mundo empresarial. Esquisito… A economia é uma ciência de números e a felicidade é subjectiva. Então, como é que a afectividade e a felicidade se cruzam com o pensamento económico?


O mote começou por ser: “Se tivesse apenas mais dez minutos de vida, o que faria?”.

A resposta foi: “Ia para casa ver os meus filhos”. Bom, eu não, que não tenho. Mas era o que o professor Luís Santos Pinto, da Universidade Nova de Lisboa, faria. Ter um filho é uma motivação genética, no entanto, pode ser uma má experiência. Há bebés que choram muito, que não nos deixam dormir… Será que quero ter um filho? Será que quererei ter dois filhos? Nesta decisão pesam componentes afectivas, mas também económicas. Afecto pode não faltar, dinheiro para um poderei ter, mas para o segundo… É aqui que entra a economia. Da componente económica faz parte o rendimento e este dá para prever.

Mas o que é a felicidade?

Considerando que a felicidade é “bem-estar”, a ela está inerente subjectividade, pois países diferentes terão critérios diferentes. É por ser um conceito subjectivo, que, para a Economia, é difícil medi-la. Apesar disto, é possível partir de medidas individuais para um todo e encontrar métodos que permitam medi-la e construir rankings comparativos entre países. Os dois rankings mencionados foram o World Values Survey e o Eurobarómetro. Segundo este último, Portugal tem 17 por cento de pessoas muito felizes, abaixo da média da União Europeia, 26 por cento. A Dinamarca vem no topo, com 49 por cento.

E será que a felicidade se compra?

Contra todas as expectativas, empiricamente os dados indicam que sim. Num dado país as pessoas mais ricas são as mais felizes, porque o rendimento é importante. Afinal, até não parece estranho e é até consistente com a teoria económica mais básica. Fazemos escolhas com uma restrição económica orçamental. Portanto, quanto mais elevado for o nosso rendimento, mais escolhas poderemos fazer!
Mas será que este acréscimo de felicidade é sempre proporcional ao acréscimo de rendimento? Não. O incremento é cada vez menor. Se na compra do primeiro Porsche (!!) ficamos felicíssimos, na compra do terceiro, a felicidade já não é tão grande. Daqui resulta que faz sentido cobrar mais impostos às pessoas mais ricas.

Será mesmo verdade que é o aumento do rendimento que provoca um aumento de felicidade? Não será que é a felicidade que faz aumentar a produtividade e que um aumento na produtividade provoca um aumento no rendimento?
Não. Provou-se que a causalidade vai do rendimento para a felicidade. Claro que o inverso poderá ser verdadeiro em alguns casos, mas normalmente é um acréscimo no rendimento que provoca um “incremento de felicidade”.

Quer dizer que o dinheiro é aquilo que nos torna felizes?

Felizmente, não! Existem sete factores principais que nos tornam felizes e cuja ordem varia consoante o país e cada uma das pessoas. A ordem genérica para os países ricos é esta:
1.º Relações familiares.
2.º Rendimento.
3.º Trabalho.
4.º Comunidade e amigos.
5.º Saúde.
6.º Liberdade pessoal. Aqui verificou-se que a qualidade do governo conta muito. Um exemplo flagrante é o caso da Rússia, que no ranking surge como país altamente infeliz.
7.º Prática de religião, ligação ao transcendente, meditação.
Depois, existem para além destes, outros factores como comer, fazer exercício, fazer sexo, relaxar, …
Outro aspecto interessante é verificar-se que, ao longo da história, os níveis de felicidade também podem ser medidos. Em 1820, 80 por cento da população vivia com menos de um dólar (comparado ao valor de hoje); na Idade Média, vivia-se para sobreviver; e hoje somos mais felizes, embora os níveis de felicidade estejam “flat” desde os anos 50.

Por que é que somos mais ricos, mas não somos mais felizes?

Várias teorias têm sido apresentadas para explicar este fenómeno:
1.º Artifício estatístico
Quando medimos o rendimento per capita, ele pode ir até valores incalculáveis, mas a escala da felicidade é limitada. Vai de zero a quatro. Se calhar, era necessária uma escala maior e simétrica.

2.º Teoria do Setpoint
Cada indivíduo tem um nível predeterminado de felicidade, que é determinado geneticamente. O fundamento está, por exemplo, em pessoas que ganharam a lotaria ou em pessoas deficientes, que não ficaram estupidamente mais felizes, nem estupidamente mais infelizes. No entanto, esta teoria é discutível, porque as pessoas não se conseguem adaptar completamente.

3.º Teoria da Habituação
Todos aspiramos a ter certas coisas. Apesar de ficarmos mais ricos, as nossas aspirações também são maiores. Esta teoria também é criticável, porque parte do princípio de que as nossas preferências não são estáveis.

4.º Teoria dos “bens de status”.
Esta teoria, também conhecida pela do “relative income”, diz que nós nos comparamos com os outros. Temos inveja das pessoas mais acima de nós. E, diz-nos também, que somos um bocado cínicos. Quando estamos em baixo, preocupamo-nos com a igualdade, queremos políticas sociais, mas quando estamos em cima, já não nos importamos tanto. Entramos numa “escalada competitiva”. Se o meu vizinho tem um BMW, eu também tenho de ter, se ele compra depois um Porsche, eu também vou ter de ter um, … Mais uma vez, esta teoria, como quase todas, é criticável, porque dois terços do peso vai para o rendimento absoluto. A partir daí é difícil dizer o que é um bem de status. Será que a casa é? Depende.

5.º Teoria do Capital Social
Também conhecida por “bowling alone” (Robert Putnam – RP), diz-nos que estamos a tornar-nos mais individualistas e menos sociáveis. Temos mais rendimento, logo podemos ter mais saúde, logo somos mais felizes. No entanto, temos um capital social menor, logo os dois factores anulam-se e não nos tornamos mais felizes. A crítica a esta teoria está em saber o que é o capital social. O RP não deu uma boa definição, porque não levou em conta o facto de o tipo de comunicação ter mudado. Hoje utilizamos mais o telemóvel, mais a internet. Mas será que isto nos torna mais infelizes? Realmente, há fenómenos que nos criaram mais stress, por exemplo, o querermos estar melhor que os outros. John Nash, na sua Teoria dos Jogos, mostrou-nos que, em muitas situações, podem haver vários equilíbrios e que podemos cair num equilíbrio menos bom.

Por exemplo, na Holanda, para criar um melhor equilíbrio, os sindicatos negociaram empregos em part-time, para haver mais pessoas a sair às 4h30m e assim dedicarem mais tempo à sua vida social.
Será que estamos a ser irracionais ao ficar em casa, não socializando e, por isso, sendo mais infelizes? Não. Simplesmente fazemos as escolhas com base naquilo que conhecemos da sociedade. É mais difícil encontrar grupos, porque é mais fácil ficar em casa, logo ficando em casa, não se formam grupos e, por isso, somos menos motivados a sair de casa.

Será que os governos e os economistas deverão passar a utilizar a felicidade para medir os níveis de satisfação de um país, em vez do PIB?

É preciso ter em consideração três coisas:
1.º Os economistas analisam o PIB real e não o nominal;
2.º Os economistas analisam o PIB per capita;
3.º A longo prazo não consumimos mais do que o que produzimos.

É verdade que o PIB é uma medida com grandes problemas. Tudo o que não passa pelo mercado não é contabilizado pelo PIB. Se fizermos um belo jantar em casa, não passa. Mas, se contratarmos uma empregada para o fazer, passa. Qual nos faz mais felizes? Um idoso num lar passa pelo PIB, podendo associar-se maior felicidade a um lar mais caro, mas se estiver em casa com a família, não passa. Onde é que ele é mais feliz? Portanto, o PIB está enviesado quanto às interacções sociais. Por outro lado, o PIB não leva em conta a degradação ambiental e, por ser uma média, não leva em conta a distribuição do rendimento.

Então porquê continuar a utilizar o PIB?

Porque é uma medida objectiva. Na felicidade não há comparações objectivas possíveis, porque cada país valoriza coisas diferentes e, assim, teriam de ser criados rankings diferentes consoante os países. Por exemplo, parece que os europeus têm mais tempo livre e valorizam-no mais e são mais avessos à desigualdade. Já os americanos não valorizam tanto isto. Quem é mais feliz?
O PIB pode ser abandonado, mas têm de ser avaliadas outras medidas.

O “Economist” pegou em sete factores de qualidade de vida, mensuráveis, e com eles criou um ranking, o “World Quality of Life”.
1.º Liberdade Política (?): 26.2%
2.º Saúde (esperança de vida à nascença): 19%
3.º Bem-estar material (PIB per capita): 18.8%
4.º Vida em comunidade (taxas de ida à igreja e de participação em encontros): 12.2%
5.º Relações familiares (taxas de divórcio): 11.3%
6.º Segurança no trabalho (taxa de desemprego): 7.7%
7.º Igualdade dos sexos (rácio de rendimentos f vs m): 4.8%

Portugal encontra-se no 19º lugar em qualidade de vida (WQL) e em 31º no PIB.
Por exemplo, a Rússia encontra-se no 105º em WQL e em 55º no PIB.
Os Estados Unidos estão no 13º em WQL e em 2º no PIB.

No ranking do PIB per capita dos países mais ricos estamos abaixo dos vinte primeiros, sendo a nossa posição, em 2005, a 31ª; em 1990, no World Ranking of Hapiness, estávamos em 35º; e, em 2005, no World Ranking of Quality of Life estávamos, como já disse, em 19º.

Conclusão: Não somos muito felizes, não somos muito ricos, mas temos uma grande qualidade de vida.

27.8.07

Ricardo Quaresma - Perfil de um Mágico



“Mustang”, “Harry Potter” ou Ricardo Quaresma, qualquer um dos nomes serve para identificar este “jogador da bola”, que com apenas 23 anos já fez história no futebol português.

Começou no Sporting Clube de Portugal, onde se estreou na equipa principal com dezoito anos. Estávamos na época 2001/2002 e Laslo Boloni era então o treinador. Foi ele que baptizou Ricardo Quaresma com um nome que reflectia a raça e a rebeldia do jogador, “Mustang”. De simples rebelde a cavalo de raça, a história fez-se no entretanto e começou antes, bem antes, quando ainda andava na Escola Domingos Sávio. António Silva, o primeiro treinador diz que "só queria a bola para ele." Foi depois contratado pelo Sporting, após um “olheiro” o ver a fazer o tipo de passes que, ainda hoje, são a sua imagem de marca. Mais tarde fez sensação na selecção sub-16, a qual ganhou, em 2000, o Europeu em Israel. Mais uma vez houve alguém nas bancadas que o viu e o contratou. Desta vez, para fazer a pré-época no Sporting.

Em 2003, o Barcelona viria a pagar seis milhões de euros pela sua transferência. Mas a vida não lhe correu bem pelas terras da Catalunha. Em Maio desse mesmo ano, após 22 jogos, onze dos quais como titular, conflitos com o treinador e uma lesão no pé obrigaram-no a parar durante dois meses e foi então que resolveu voltar a Portugal, sem cumprir o contrato de quatro anos em Espanha.

Em terras lusas, juntou-se ao Futebol Clube do Porto, onde joga actualmente com a camisola sete, na posição de extremo direito. Quando entra em jogo, benze-se, e dentro do campo destaca-se pelo seu remate fortíssimo e pela "trivela", um cruzamento com a parte de fora do pé direito.

De si próprio, diz ser alegre, simpático e orgulhoso. Com ascendência cigana, um dos valores que preserva da sua tradição cultural é a dedicação à família. No entanto, após o divórcio dos pais, Ricardo ficou a viver com a mãe, não tendo sido educado dentro da cultura cigana.O irmão é uma das pessoas mais importantes na sua vida. Alfredo foi uma esperança no Sporting, mas nunca chegou a ser uma certeza. Foi ele que impediu Ricardo de deixar o futebol para se dedicar ao hóquei em patins. Na altura tinha dez ou onze anos e praticava no CACO de Campo de Ourique.

Para os críticos, Ricardo é um jogador irregular. Mas será isto mau? Miguel Sousa Tavares, conhecido pela sua devoção ao clube azul e branco diz “pois eu tenho a tese contrária: há grandes jogadores que valem pela sua regularidade e há grandes jogadores, que vivem da inspiração repentina e que, necessariamente, são irregulares”.

João Bonzinho, outro crítico, compara-o a Cristiano Ronaldo. “Cristiano Ronaldo é bem capaz de ser o melhor jogador do mundo neste momento, mas Quaresma é mais «selvagem», mais «puro» enquanto génio. Cristiano é um jogador completo, arrebatador, demolidor; Quaresma é um mágico, um daqueles jogadores capazes ainda de inventar truques com uma bola, de fazerem o impensável de, na subtileza de um simples toque, mudarem o vento do jogo.”

Basta fazer uma busca na internet, para se perceber a sua fama. O seu nome aparece referenciado 56 mil vezes só em páginas portuguesas. Luís Figo, por exemplo, aparece apenas 54 mil vezes. Tem vários blogues e páginas não oficiais criadas pelos fãs e, visitando-as, repara-se que é apreciado por adeptos do seu clube, mas não só…

18.8.07

Gastronomia Molecular - Reportagem



Gastronomia ou Experiência Científica

Muito daquilo que fazemos ao preparar um prato pode ser descodificado pela ciência, tendo por base a composição dos alimentos e as alterações físicas e químicas que ocorrem durante a sua preparação. Quando a Física e a Química deixam o laboratório e entram na cozinha, o que acontece?


Numa das salas do Instituto Superior de Agronomia (ISA) o curso vai começar. Este já é o terceiro dia em que se repete. Os dois primeiros esgotaram. Aqui vão ser abordadas questões da gastronomia do ponto de vista científico, onde as moléculas são o centro das atenções. Estamos num curso de Gastronomia Molecular.

Antes de começar, faz-se a apresentação dos professores. São um grupo que se encontrou em 2001 no projecto “A Cozinha é um Laboratório”, da agência Ciência Viva, uma unidade do Ministério da Ciência e da Tecnologia, que visa a promoção da cultura científica e tecnológica junto da população portuguesa. Na altura, o objectivo era divulgar a ciência de uma forma “saborosa”. As suas formações são diversas. Paulina Mata, Margarida Guerreiro, Catarina Prisca e Conceição Loureiro-Dias têm formação em química e engenharia química. Joana Moura é arquitecta paisagista e bolseira do ISA na área de Gastronomia Molecular. O grupo deu-se bem e, hoje, continua junto, partilhando o interesse pelas bases científicas da cozinha.

Do outro lado, a assistir ao curso, também estão pessoas de diferentes áreas. O chefe de cozinha e a pasteleira do Casino de Lisboa, o sub-chefe de cozinha do hotel Cascais Mirage e o chefe de cozinha do Hotel Avis marcam presença, tendo como objectivo comum o aprofundar de conhecimentos nesta área para aplicação no seu dia-a-dia.

A aula inicia-se e a questão impõe-se: porquê molecular? No entanto, a resposta é simples: “Todos os alimentos são constituídos por átomos que se ligam formando moléculas. Quem cozinha manipula o movimento das moléculas, as suas ligações e alterações e a quantidade e o processo de transferência de calor”, esclarece Margarida Guerreiro, procurando desmistificar esta nomenclatura e outros dos “medos” de quem contacta pela primeira vez com esta ciência, a utilização de químicos. Qual o elemento essencial na cozinha? “A água. A água é um mundo. Somos nós. A par do cloreto de sódio é o reagente mais simples”. Afinal a água é um composto químico, duas moléculas de hidrogénio e uma de oxigénio. Utilizamo-la todos os dias. Se pretendermos grandes e rápidas alterações químicas, basta subir a temperatura para aumentar o movimento das moléculas. É esta a explicação por trás de um acto quotidiano tantas vezes repetido: se queremos que o leite aqueça mais rápido, basta rodar o botão do fogão.

Da teoria passa-se à prática. Estamos agora num dos laboratórios do instituto. Em cima das bancadas vêem-se desde varinhas mágicas e batedeiras, a tubos de ensaio e pipetas. Joana Moura apresenta o alginato, o xantano e o gluco. Não passam de pós. Começa-se por fazer uma solução de alginato com chá. Sob o olhar atento dos chefes de cozinha, explica “Fica com ar. Tem de se esperar duas horas. Ou colocar numa máquina de vácuo”. Passa-se à metilcelulose: “Só se dissolve a frio, mas só dispersa a quente. No entanto, se aplicarmos força motora não é preciso aquecer. Como incorpora muito ar, tem de repousar a frio”.

João Fernandes é aluno do curso de Cozinha e Pastelaria da Escola de Hotelaria de Lisboa. Quando interrogado sobre a razão que o leva a estar aqui, responde: “Tendo em conta que os quatro melhores restaurantes do Mundo utilizam os conhecimentos da Gastronomia Molecular aplicados à cozinha, parece-me importante vir adquirir tais conhecimentos. Por outro lado, este é o único instituto em Portugal a leccionar cursos nesta área”. Depois de ouvir as explicações, passa à acção. O objectivo é fazer pequenas esferas utilizando uma solução de sumo com xantano a 0,3 por cento e gluco a 2,5 por cento. Na Gastronomia Molecular a precisão nas proporções e nas quantidades é crucial. Quem a queira praticar, para além de ter uma balança de precisão, deverá ser bom a matemática. A famosa “regra de três simples” é utilizada todos os dias, pois só com ela se poderão manter as proporções.

Mas o interesse por esta “ciência” não passa só pelos profissionais de cozinha. Maria Leonor Souza é responsável pelas publicações culinárias da Unilever – Jerónimo Martins. O que a leva a frequentar este curso é o interesse por estes temas e o factor “novidade”: “É uma maneira diferente de abordar o acto de cozinhar e a combinação dos sabores e das texturas. É uma área que ainda está pouco explorada e que é muito interessante. O meu objectivo é entusiasmar as pessoas. Agora está a renascer um entusiasmo grande pela cozinha e cozinhar está na moda ”.

Continua, ela também, a seguir a receita. Feitas as esferas, deitam-se na solução de alginato, deixando repousar durante 3 minutos. Passado este tempo, o resultado está à vista: pequenas bolinhas de aspecto gelatinoso, assemelhando-se a gomas. Quando levadas à boca, rebentam, libertando o sumo. O efeito surpresa é plenamente alcançado. “É este o objectivo da Gastronomia Molecular: surpreender através da diferença nas texturas e da atractividade visual”, explica Margarida Guerreiro, acrescentando que “A novidade neste mundo globalizado em que podemos experimentar a gastronomia de países tão diversos como o Tibete ou o Brasil dentro da mesma cidade, já não está nos sabores. Ela surge da colaboração entre cozinheiros e cientistas que inventam novas texturas e introduzem novas cores”. Assim, para conseguir estes efeitos, novas técnicas e substâncias são utilizadas. O azoto líquido, por exemplo, serve para dar uma consistência mais cremosa aos gelados; a peelenzima consegue descascar um citrino sozinha e os transglutaminases dão para colar alimentos que tenham proteínas. Uma das professoras sugere “Experimentem juntar galinha com atum!”.

O medo dos “E”

Muitas destas substâncias são também designadas por “E”. Não se estarão a utilizar produtos prejudiciais à saúde? “Tudo o que é ingerido em demasia faz mal. Se comermos um quilo de amêndoas, não vamos de certeza passar bem, pois embora em quantidades muito pequenas, têm cianeto”, esclarece Catarina Prisca e Joana Moura acrescenta: “Muitas destas substâncias são extraídas da natureza e já utilizadas há muito tempo em países como, por exemplo, a China”. Margarida Guerreiro conclui, afirmando: “Os espessantes não são cancerígenos. Nada está provado. Há uma grande desinformação”.

História

A denominada “Gastronomia Molecular” começou quando um físico e um químico se juntaram para perceber os processos que ocorriam na cozinha. Estávamos em 1988 e o trabalho de Nicholas Kurti e Hervé This demonstrou que muito daquilo que fazemos com base na experiência pode ser descodificado pela ciência, tendo por base a composição dos alimentos e as alterações físicas e químicas que ocorrem durante a sua preparação. É de Nicholas Kurti (o físico húngaro) a célebre frase “É preocupante que se saiba mais sobre a temperatura no interior das estrelas do que sobre a temperatura no interior de um prato de soufflé”.

Dicionário de substâncias espessantes, gelificantes e estabilizantes:

Espessante: permite aumentar a viscosidade de um alimento.

Gelificante: confere textura através da formação de um gel.

Estabilizante: contribui para dar uniformidade ou consistência a preparados.

Hidrocolóides: são colóides (substância semelhante a cola) com uma especial atracção pela água e que, quando em contacto com esta, agarra-a como que “aprisionando-a”.

Metilcelulose: é um dos aditivos alimentares permitidos pela legislação comunitária e americana, designado por E 461. É produzida industrialmente a partir da celulose.

Xantano: é um dos aditivos alimentares permitidos pela legislação comunitária e americana, designado por E 415, sendo utilizado desde 1969. É um polissacárido (hidrato de carbono muito grande) produzido pela bactéria Xanthomonas Campestris, frequente em folhas de couve, couve-flor e brócolos.

Alginato: é uma das substâncias mais abundantes na natureza. É um polissacárido extraído de algumas algas castanhas Phaeophyceae, principalmente de espécies do género Laminária.

Mais Informação

Blogue “Jo Cooking”: http://www.jocooking.typepad.com

Site “Ciência Viva”: http://www.cienciaviva.pt

Instituto Superior de Agronomia

4.8.07

Perfil de Rui Horta, Coreógrafo - 3ª Parte



Em 1984 regressou a Portugal, porque tinha saudades, mas sobretudo porque lhe ofereceram a oportunidade de criar uma companhia de dança. Foi a Companhia de Dança de Lisboa. Tratava-se de um projecto de continuidade daquilo que eram as companhias de reportório. Era um projecto mais voltado para a dança moderna com alguma nova dança e dança contemporânea. Nela começaram a dançar pessoas como João Fiadeiro, Benvindo Fonseca e Clara Andermatt. “Era praticamente o único sítio onde se poderia fazer dança de uma forma mais profissional fora do Ballet Gulbenkian. Foi bonito nesse aspecto, mas foi limitado no ponto de vista estético. Não foi um projecto de ruptura”. Convidou um dos seus melhores amigos para fazer a direcção administrativa, José Manuel Oliveira, que nessa altura era fotógrafo, mas as coisas acabaram por não correr bem. “Houve uma situação um bocado desagradável, um processo um pouco “hamletiano”. Ficou ele com a companhia e eu fui posto na rua, o que foi fantástico para mim, agradeço-lhe profundamente”.

Foi nesta altura que surgiu outra das pessoas mais importantes no seu percurso, Carlos Andrade, marido de Vanda Ribeiro da Silva. “Foi um homem extraordinário comigo, apoiou-me”. Carlos Andrade, quadro intermédio num governo muito frágil, emprestou-lhe o seu dinheiro pessoal para lançar o Rui Horta & Friends. “Não havia Ministério da Cultura na altura, havia uma vaga Secretaria de Estado da Cultura, com uma direcção geral de acção cultural”. Aqui Fernando Alçada, director geral de acção cultural, também teve um papel importante, ao apostar no seu trabalho. “São estas coisas que nos fazem crescer”.

E Rui Horta cresceu. Os seis anos, entre 1984 e 1990, são caracterizados por uma grande vontade de passar conhecimento de tudo o que tinha aprendido em Nova Iorque a todas as pessoas que queriam dançar, “formei montes de gente e toquei uma geração inteira”. Nesta altura, tinha o estúdio nos Bombeiros Lisbonenses. Este estúdio foi um ponto de encontro de freelancers, livre para toda a gente. “Era o meu estúdio de dança. Toda a gente tinha a chave. Muita gente ensaiava”. Nomes como João Fiadeiro e Clara Andermatt passaram por lá, “às dez da noite iam para o estúdio e ensaiavam até à uma, duas da manhã. Porque era de todos”.

É então que o coreógrafo parte para a Alemanha, ali fica por dez anos e regressa para se instalar em Montemor-o-Novo. A relação de empatia com o Presidente da Câmara, Carlos Pinto Sá, foi fundamental. “Falámos meia hora e ele foi-me logo mostrar o convento. Ficou decidido ao fim de meia hora que eu ia ficar lá”. Ao fim de dois meses, Rui Horta já estava em Montemor com “armas e bagagens”. O primeiro outdoor que pôs do lado de fora do convento teve inscrita a frase “Estamos Cá”.

A relação de Rui Horta com a terra que o acolheu tem sido marcada por um trabalho muito próximo com várias instituições. Após seis anos, o Convento da Saudação, graças ao seu trabalho, está parcialmente recuperado e as negociações com o governo para a recuperação deste, que é o maior convento do sul de Portugal, estão a decorrer. A proximidade com o tecido escolar também tem sido uma aposta.

Mas, para lá deste trabalho sociocultural, há o trabalho que é realizado no centro coreográfico “Espaço do Tempo”. Ali recebe anualmente 36 equipas criativas, que se traduzem em mais de 700 artistas. “Pessoas emergentes. Quando recebemos um pedido, vamos ver a companhia in locco ou vemos em vídeo. É um trabalho muito intenso. No fim de contas, quem tem de escolher, tem de estar informado. Essa é a parte mais dura, mais difícil”.

Quando olha para trás custa-lhe a acreditar que já tivessem passado trinta anos. Foram milhares e milhares de horas a trabalhar com pessoas, em que conheceu o mundo inteiro. Existiram momentos de grande solidão. “Sozinho no meio de uma grande cidade”. Mas também existiram momentos de enorme sucesso em cidades do outro lado do planeta, como Tóquio e Xangai. “São 30 anos que já são para mim duas vidas, ou três. Hoje já podia ir-me embora, porque já fiz tudo o que tinha para fazer, não preciso fazer mais”.

No entanto, o arquitecto, bailarino, professor, coreógrafo e pai tem cinquenta anos e continua a receber convites para sair de Portugal. “É muito tentador, mas não vejo os meus filhos a mudarem para outro país. Se eu não tivesse crianças, talvez”. Os seus filhos vivem e estudam em Montemor. “Vai tudo à escola em Montemor. À escola pública, à saúde pública. Eu sou uma pessoa que acredita nos serviços públicos. As pessoas têm que pagar impostos, mas têm que exigir dos governantes”. Esta educação que dá aos filhos é muito diferente da que ele próprio e os seus sete irmãos receberam. O pai foi professor catedrático da Faculdade de Medicina. “Foi um médico bastante conhecido em Portugal, foi bastonário da ordem dos médicos. Foi director de um hospital”. A mãe também foi professora universitária, doutorada em anatomia patológica.

O filho “do meio da tabela” viveu a sua infância e adolescência nas Avenidas Novas, em Lisboa, mais precisamente na esquina da Av. Defensores de Chaves com a Av. Miguel Bombarda. Foi aluno da turma B do Camões, da qual saiu também António Guterres. “Venho de uma família com um nível intelectual muito grande. Os meus pais, apesar de terem profissões muito técnicas, eram pessoas intelectualmente muito diferenciadas. Tenho uma irmã, a Maria Teresa Horta, que é poetisa e tenho um irmão que é de História. Há de tudo na minha família”. Dos seus ex-colegas do Liceu Camões ainda mantém contacto com alguns, entre eles, António Carrapatoso, actual presidente da Vodafone. “É um homem muito inteligente, com quem é bom conversar”.

Teve uma infância feliz, embora a considere um pouco formatada. “Foi uma educação da burguesia intelectual portuguesa, com umas referências um pouco britânicas, como compete à própria burguesia portuguesa”. Da parte do pai teve uma influência muito grande da literatura francesa. “O meu pai lia muito Simone de Beauvoir, Saint-Exupéry, Sartre, Balzac, toda aquela literatura de referência francesa que andava sempre ali por cima do escritório e que eu li muito cedo”. Cedo começou a assinar o L’Avant Scène, onde viu as primeiras “figurinhas” de espectáculos, com fotografias, textos teatrais, que lia em francês. “Na prática fui um privilegiado. Tive acesso, desde muito cedo, a estas experiências fortíssimas”. No Verão, como contra-ponto a esta educação um pouco mais formal no Inverno, eram, ele e os irmãos, deixados à solta numa praia do sul durante muitos meses com uma tia já mais velha. “Libertou-nos de algumas tensões de formatação. Equilibrou a balança. Foi um tempo absolutamente maravilhoso, de selvajaria, de possibilidade de conhecer tudo e mais alguma coisa”.

Hoje pensa que poderá não estar a dar aos filhos aquilo que os seus pais lhe deram. “É uma grande incógnita para mim. Tenho dúvidas se estou a fazer bem”. Por outro lado dá-lhes muitas outras coisas. “Temos tempo para eles. O meu pai não estava tão perto de mim, como eu estou dos meus filhos. Faço os trabalhos de casa com eles e vamos dar passeios no campo. Andamos de bicicleta. Falamos imenso. Todas as noites lhes conto uma história e há uma grande proximidade na família”.

Rui Horta, para lá de coreógrafo, é um criador e considera o que faz um trabalho de auto-destruição. “Eu nunca estou contente. Mas eu também sou assim. Mesmo quando estou calmo, nunca estou sereno”. Se tivesse de escolher os trabalhos mais representativos destes trinta anos, Rui Horta escolheria a primeira obra que foi fazer para a Alemanha, “Linha” (uma das obras de ruptura. Em 1989). Depois optaria pela obra que o tornou conhecido mundialmente, “Objecto Constante”, em 1994. Há também uma “obra maldita”, mas que adora, “Khora”. “É o nome de um livro do Jacques Derrida, que eu gosto imenso e que deu origem a uma obra negra minha, mas que é talvez uma das minhas melhores obras, em 1997”. E, finalmente, a obra que considera ser a mais forte, “Pixel”. “O Pixel aparentemente marcou muita gente. Continua a ser uma obra muito pedida, muito pretendida. Há coisas assim misteriosas. Não custou nada a fazer. Fiz isto num mês e meio. As coisas que eu tenho feito de mais interessantes não têm custado. Às vezes quando a gente se envolve imenso com as coisas, custa que se farta”.

Para o criador Rui Horta há de facto um processo de criação que é quase como um processo de incubação de uma doença viral. “Apanhas uma infecção qualquer. Sem saber o que tens ainda, começas a ter dores no corpo. Tens sintomas, mas não sabes ainda qual é o diagnóstico”. Para ele, a criação é isto. Começa com os seus livros de cabeceira. Dantes, tinha, por exemplo, os do Rem Koolhaas, prémio nobel da arquitectura (Pritzker) e o “Delirious New York”. Depois passou a ter o “Small Medium Large x-Large”. “A gente vai lendo. Ao fim de seis meses, apercebes-te que já tens a obra mais ou menos, mas que estás a ficar tenso. Aquilo é uma coisa que te afecta”. Depois vem a fase de decidir efectivamente fazer a obra “x”, em que se pede o dinheiro. É aqui que o criador põe tudo no papel. E depois vem a concretização. “Quando vais para o estúdio fazer a obra é a terapia. Depois da incubação, depois do diagnóstico, vem a terapia para te curar”. E, por fim, a estreia. “O momento da estreia é o momento em que estás curado. Estás curado, acabou, tiraste aquilo do sistema. A criação é mesmo daquelas coisas que é criar ou morrer”. E, ao sétimo dia, descansa, fica muito tranquilo, um bocado apático durante uns tempos, porque ficou curado. E depois começa a vir outra incubação, mais um vírus, mais um vírus…

Inês Branco, Julho de 2007

1ª Parte

2ª Parte

2.8.07

Perfil de Rui Horta, Coreógrafo - 2ª Parte


Pixel


Dos dez anos de Alemanha, houve uma nova crise em 1997. Mas houve também a criação de outra companhia, o Rui Horta Stageworks, que ainda existe hoje e com a qual assina, para diferenciar do Espaço do Tempo, o espaço multifuncional criado em Montemor. Chama-se Stageworks, porque com esta companhia não faz apenas dança. Faz instalação, artes plásticas, multimédia, teatro, ópera e artes de palco. Os anos em que esteve na moda passaram. O Thèâtre de la Ville foi seu co-produtor. “É o teatro mais importante em toda a Europa, talvez em todo o mundo. É o teatro mais importante em todo o mundo e eu fui co-produzido pelo Thèâtre de la Ville durante seis anos, entre 93 e 99. Ganhei em 92 o concurso Bagnolet, que é uma espécie de Óscares da dança.”

Para Rui Horta os prémios significaram sempre uma surpresa muito grande. “Quando eu ganho Bagnolet nem acredito. Depois é que me apercebi que havia 400 coreógrafos e eu ganhei. 400 coreógrafos do mundo inteiro e tu não percebes. Nem chegas a perceber. Ganhaste, pronto! No dia seguinte vais a casa dos teus amigos ou vais jantar fora”. A surpresa foi ainda maior talvez porque não foi Rui Horta a candidatar-se ao prémio. Foi um conjunto de catorze teatros alemães que se juntou e que o candidatou a representante alemão em 1991. Rui Horta só soube quando recebeu uma carta com o pedido de autorização. Ainda em Portugal, em 1989, tinha-se candidatado com o “Interiores”, uma obra de que gosta muito, e nem sequer chegou a passar a primeira eliminatória de escolha. “Por aqui se vê que quando a gente quer uma coisa, não tem nada, quando a gente não quer nada tem uma coisa. A vida é uma coisa misteriosa”.

Para Rui Horta não existe óptica de carreira na profissão. Há um percurso. “Todos os dias levantas-te e fazes aquilo que sabes e gostas. Cada dia é um dia novo, é um dia ‘jubilatório’”. Agora, que está mais velho, acontece-lhe mais frequentemente levantar-se de manhã e dizer “Que bom, tou vivo. Vou fazer o que me apetece durante o dia. Tenho umas coisas chatas para fazer pelo meio, mas vou fazer deste dia um dia bestial”.

Se lhe perguntar quem foram as pessoas mais marcantes neste seu percurso, Rui Horta tem-nas bem presentes. A primeira foi uma professora muito importante na sua vida, Vanda Ribeiro da Silva, que lhe ensinou os primeiros passos da dança clássica na Fundação Gulbenkian. “Eu tinha 16 anos e caiu o fascismo. Foi uma coisa extraordinária, libertaram-se imensas tensões sociais e eu libertei o meu corpo também.” Noutra conjuntura talvez tivesse sido arquitecto. Na prática, acabou por ser um coreógrafo. Antes disto, após ter frequentado os cursos pré-profissionais, percebeu que não iria dançar no Ballet Gulbenkian. “Não tinha aquele corpo perfeito de bailarino clássico, que naquela altura era muito importante”.

Na alma ainda continua arquitecto. “Eu faço arquitectura com o “Corpus”, eu crio luz, eu crio cenografias. Vês o meu palco? É um palco de arquitectura. Não tem nada a ver com abrir a cortina e fazer uma dança. Eu sempre trabalhei com linguagens cénicas, com linguagens espaciais”.

O 25 de Abril abriu-lhe horizontes extraordinários, ficou fascinado com a liberdade, com as possibilidades de viajar. Foi aqui que surgiu Maria Ângela de Sousa, uma pessoa que foi um instrumento fundamental na sua vida. Cientista e imunologista, vivia nessa altura em Nova Iorque. Quando a mãe de Rui Horta faleceu, em 1978, com apenas 21 anos, Maria Ângela pôs-lhe a chave de sua casa nas mãos e ele foi para Nova Iorque. Pensou em ficar três meses, mas acabou por ficar seis anos. “Foi um tempo fantástico. Tudo é possível. Tive 40 mil empregos. Era filho de professores catedráticos e entreguei pizzas ao domicílio, fiz limpezas de apartamentos, dei aulas nos sítios mais escabrosos, trabalhei como garçon num restaurante. Fiz todos os trabalhos e mais alguns e, a certa altura, comecei a ser reconhecido como professor”. De facto, Rui Horta foi para os Estados Unidos para dançar, mas nos últimos anos era já um professor de referência em Nova Iorque, “talvez um dos professores mais importantes de dança moderna em Nova Iorque”.

Foi também em Nova Iorque que conheceu a sua mulher, actualmente ex-mulher, “minha grande companheira, minha grande amiga. Foi durante 15 anos minha mulher, da qual tenho 3 filhos maravilhosos”. Esta era psico-terapeuta, mas tinha uma formação de bailarina. Nessa altura dançava e foi a Nova Iorque nas férias de Verão para fazer uma “reciclagem”. Rui Horta tinha pessoas do mundo inteiro a trabalhar consigo, “conheci muita gente e conheci-a a ela”.

Este percurso profissional como professor vai desde 1982/83 até 1989/90. “Nunca diria a ninguém que sou bom coreógrafo. Mas se me perguntarem se sou um bom pedagogo, eu sou um excelente professor. Fui um excelente professor e formei bailarinos muito bons, tanto cá, como nos Estados Unidos”. Rui Horta gosta de passar conhecimento, mas gosta mais ainda de criar obras de dança. Após o regresso dos Estados Unidos, em 1991/92/93 foi professor convidado no Laban Centre em Londres, no Conservatório de Paris, no Conservatório de Lyon e na Rotherdam Dance Academy. Mas, pouco a pouco, o ensino passou a interessar-lhe menos. Estava cada vez mais fascinado pela coreografia. “A partir do final dos anos 80, princípios dos anos 90, a coreografia tomou a dianteira das minhas preocupações e eu comecei a desaparecer como professor. Aquilo não era prioritário para mim”.

1ª Parte

3ª Parte

29.7.07

Perfil de Rui Horta, Coreógrafo - 1ª Parte



Quando tudo, de repente, acontece

Mesmo quando está calmo, nunca está sereno. Rui Horta é um coreógrafo alfacinha que já viu as suas obras percorrerem o mundo inteiro. Este ano comemora cinquenta anos de vida e trinta de percurso profissional.

Sentado numa das cadeiras da plateia do Teatro Camões, fala com uma das assistentes, enquanto toda a sua equipa continua a trabalhar. Ninguém os interrompe. “Esta é uma das formas de conseguir ter tempo. Eu escolho as pessoas, formo-as e confio no trabalho delas. É preciso saber delegar”. Alto, conserva ainda o corpo magro e bem esculpido, que lhe permitirá, se um dia quiser, voltar a dançar. “Como bailarino deixei de dançar relativamente cedo, danço muito bem. Ainda hoje as pessoas perguntam por que é que não danço. E devo dizer que hoje, neste momento, com 50 anos tenho imensa vontade de fazer um solo para mim, para eu dançar”. Por enquanto, continua do outro lado, dirigindo bailarinos e criando espectáculos. Em pleno palco uma grande estrutura em barras de ferro está a ser montada. Dali a dois dias tudo tem de estar em ordem para a estreia de Pixel, um dos espectáculos mais emblemáticos do coreógrafo Rui Horta.

São três da tarde e o tempo não pára. Por volta das quatro, o táxi estará à sua espera para o levar de regresso a casa. É assim que Rui Horta gere o tempo, ao minuto. “Consigo fazer muita coisa, mas para isso é preciso organização, uma agenda”. Montemor-o-Novo foi a terra que escolheu para viver, aquando do regresso a Portugal, no ano 2000. “Quando vim para Portugal, queria vir para o Sul. Eu sou um homem do Sul, estava farto de Invernos frios, com temperaturas abaixo de zero”. Na altura, a renovação da rede de cineteatros ainda não tinha começado. Se fosse hoje, talvez ele tivesse escolhido um teatro que já existisse, no Sul ou no Norte. Montemor, no mapa, pareceu-lhe muito bom. Não era muito longe de Lisboa. Mas os grandes impulsionadores da mudança foram duas pessoas do Ministério da Cultura, Gil Mendo e Ana Marim, que o informaram da existência de um Presidente de Câmara em Montemor-o-Novo muito interessado na cultura. Disseram-lhe também que Montemor era uma cidade muito bonita, pequena e com um convento a cair, um teatro a cair e que, portanto, ele poderia fazer a diferença. Rui desceu ao sul e constatou com os seus olhos o que os outros lhe haviam dito. “Eu aqui sou um tipo que posso chamar a atenção justamente com o prestígio e com a pedalada que tenho. Vou tentar renovar estes dois equipamentos, vou tentar empurrar esta agenda, vou tentar avançar e vou viver aqui.”

É com o nascimento do terceiro filho que Rui Horta decide deixar a Alemanha e regressar, em definitivo, a Portugal. Para ele as grandes decisões da vida não são decisões estratégicas, mas sim intuitivas. “Tenho o meu terceiro filho e penso que se calhar é mais interessante eles saberem quem é o Dom Diniz, do que quem é o Bismarck.”

Este regresso dá-se após dez anos de vida na Alemanha, os primeiros sete em Frankfurt e os últimos três em Munique. É para aquele país que vai, após um ano de crise entre 1988 e 1989, tinha então 32 anos. “Entre sair da Companhia de Dança de Lisboa e fazer o meu projecto de autor (Rui Horta & Friends) eu tenho aquilo que acontece quando se tem uma relação com uma pessoa durante muitos anos. Ninguém salta de uma relação para outra. Tem-se ali um período de luto. É o ano em que nada acontece na minha vida profissional, mas é talvez o mais importante”. Apenas deu aulas para sobreviver e não foi ver espectáculos. Todos os dias ia para o estúdio com o seu gato Flash, um gato preto apanhado na rua. “Passei um ano sozinho a viver algo para dentro, meu, e a questionar todo o meu passado. A tentar esquecer tudo o que tinha aprendido para partir de bases novas. Foi muito bom. É aquilo que eu aconselho a muita gente. É ter uma grande crise na altura em que eu a tive.”

Na realidade, Rui Horta não esteve parado. Quando saiu da Companhia de Dança de Lisboa, em 1988, decidiu fazer o que apelidou de “projecto de ruptura”, o Rui Horta & Friends. Madalena Azeredo Perdigão, uma das pessoas mais icónicas na sua vida, convidou-o dois anos seguidos para criar no Acarte (Gulbenkian). “E eu crio no Acarte uma peça chamada “Linha”. Nessa peça dançam algumas das pessoas mais emblemáticas da dança portuguesa, a Carlota Lagido, o Francisco Camacho, o Paulo Ribeiro e a Clara Andermatt. No ano seguinte, em 1990, faço outra obra chamada “Interiores.” Mas foi uma professora da escola onde estava, que viu estes dois espectáculos, e que levou uma cassete sua para a Alemanha. “Essa cassete aterra na secretária do Dieter Buroch. Isto muda a minha vida.”

De repente, Rui Horta estava na Alemanha, no teatro mais importante, o Kunstlerhaus Mousonturm, cujo director é Dieter Buroch. “Vou para lá como convidado para criar uma obra, depois ele convida-me para ficar a dirigir uma companhia, o Soap.” Para Rui Horta esta foi uma grande experiência. “De repente explodi como coreógrafo”. Talvez ele tivesse alguma coisa de novo para dar, numa altura em que a grande referência era (e continua a ser) Pina Bausch e Forsyth. “Acho que o meu trabalho tem uma frescura muito grande. Dentro da contemporaneidade eu sou de facto a grande referência nos anos 90, na Alemanha, em termos de dança contemporânea. Entre 1991 e 1995 eu sou fundamentalmente um produto de exportação do Instituto Alemão, do Goethe Institute”. Fez cerca de 800 espectáculos em cerca de 8 anos, no mundo inteiro. Do Japão a África. Do Brasil à Rússia, que tinha acabado de se abrir ao Ocidente. “Estás um mês no Canadá ou estás a dançar no Joyce Theatre em Londres ou no Spirehall em Tóquio. Foi uma coisa absolutamente extraordinária para um miúdo, que era um português, um alfacinha, que de repente chegou e que nunca pensou que tivesse esse talento.”

Em 1997, mudou-se para Munique, três anos antes do regresso a Portugal. Frankfurt não era uma boa cidade para se ter crianças e Munique, cidade do Sul da Baviera, para além de ser muito bonita, tinha a vantagem de estar perto do sítio onde moravam os sogros. A família tornou-se importante, após muitos anos de profissão. “De repente as crianças são a coisa mais importante da minha vida. De facto, o amor é a coisa mais importante das nossas vidas. Apesar de eu ter uma profissão excitante, os afectos são mais importantes”. E foi por esta razão que se aproximou de onde estavam os seus laços familiares. No entanto, em termos profissionais Munique não lhe oferecia o mesmo que Frankfurt. “Foram dois anos ainda muito bons para mim na Alemanha, mas foram já anos em que eu sentia vontade de voltar a Portugal”.

2ª Parte

3ª Parte

Intervalo

Como nos próximos três meses não farei entrevistas, aproveito para colocar aqui outros trabalhos jornalísticos.

22.6.07

Entrevista com Miguel Duarte Sobre a Crise Política na Turquia - 2.ª Parte

Esta é a segunda parte da entrevista com Miguel Cunha Duarte (MD), Presidente do Movimento Liberal Social (MLS) sobre os problemas políticos da Turquia e os entraves à entrada na União Europeia (EU)


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IB: Há também o problema dos rebeldes separatistas curdos do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão)? Como é que vês este problema associado aos outros dois?

MD: Há curdos no Iraque e em determinadas zonas da Turquia há um maior número de curdos. Mas também há curdos espalhados pela Turquia. Em Istambul também já existe um grande número de curdos. Neste momento, quando se fala eventualmente numa independência é algo muito complicado, porque eles, em busca de um melhor nível de vida saíram da zona próxima da fronteira com o Iraque para Istambul e para outras grandes cidades da Turquia.

Penso que a solução passa por dar-lhes mais liberdade de expressão e passa pela possibilidade de falarem a sua língua, terem meios de comunicação na sua língua e de ter os seus partidos políticos. Por exemplo, há pouco tempo, numa campanha eleitoral houve curdos que foram presos por estar a fazer campanha política na língua curda em vez de em turco.

Sob este ponto de vista é um problema de liberdade de expressão que existe na Turquia. Claro que também não vejo com bons olhos o terrorismo que tem sido praticado pelo PKK e inclusivamente agora por causa do Iraque. No Iraque a zona curda está já é semi-independente e é nessa zona que existe grande quantidade de petróleo e há dinheiro, vindo das receitas que estão a ser geradas na zona curda do Iraque, que está a ser usado para praticar actos de terrorismo na Turquia. Também está a ser uma base a nível dos terroristas para estarem no Iraque. O exército turco já afirmou que poderia invadir o Iraque em caso de mais ataques, o que, mesmo a nível internacional seria algo muito perigoso. Imagine-se o que seria a Turquia agora também entrar na guerra do Iraque, invadindo a zona curda que é, por coincidência, a zona mais estável dentro das várias zonas que existem no Iraque. É um problema que é bastante grave e que pode ter repercussões no médio oriente a vários níveis.

IB: Para além do problema do Curdistão, temos a questão de Chipre. A Turquia não reconhece o Chipre, o que é mais um entrave à entrada na Turquia na União Europeia.

MD: É verdade. Neste momento o Chipre está separado. Temos uma zona grega, que é aquilo que se conhece por Chipre na Europa e que aderiu à União Europeia recentemente e temos a zona turca ou de maioria turca, que a Turquia reconhece ser um estado independente, mas o resto da comunidade internacional não reconhece.

Houve no ano passado um referendo promovido pela Nações Unidas, em que foi perguntado a ambas as partes do Chipre se concordavam com um acordo das Nações Unidas. Aquilo que a União Europeia esperava na altura e foi por isso que o Chipre grego entrou para a EU era que ambas as partes ou aceitavam esse acordo ou a parte grega aceitava esse acordo e a parte turca rejeitava-o, mas curiosamente aconteceu o contrário. A parte turca aceitou o acordo, mas a parte grega rejeitou-o e, no fim, a parte que foi recompensada foi a parte grega.

A Turquia é um país nacionalista, a Grécia é um país nacionalista e também é uma situação de muito difícil resolução. Há questões que têm a ver com os bens das pessoas. Houve casas de gregos que fugiram na altura da guerra e que estão na parte turca, que entretanto forma vendidas a ingleses e os gregos querem as suas casas de volta. Existem muitas questões que vão ter de ser resolvidas e de facto, são um grande entrave à entrada da Turquia na EU, até porque a própria Turquia não reconhece o Chipre grego e não abre os seus portos e a EU quer obrigá-la a fazê-lo. Este é mais um dos obstáculos e é dificultado por nacionalismo de ambos os lados. Como agora o Chipre faz parte da EU também tem poder de veto, que vem agravar ainda mais o problema de uma eventual adesão no futuro da Turquia à EU.

IB: Vários membros do MLS, quando foi a segunda volta das eleições em França preferiram o Sarkozy à Ségolène Royal. No entanto, a França com a vitória de Sarkozy opõem-se à entrada da Turquia. Vês alguma razão nesta posição de oposição?

MD: Nenhum dos candidatos que foram à segunda volta das eleições presidenciais francesas eram candidatos liberais. Um dos candidatos, o Sarkozy, é claramente conservador e a Ségolène Royal é socialista. Portanto, de um ponto de vista liberal ambos os candidatos estavam muito longe de ser o ideal.

IB: O candidato apoiado pelo MLS seria o François Bayrou, não era?

MD: Exactamente. Foi também o candidato aprovado por um partido que nasceu recentemente em França, que é um partido liberal. Mas eles próprios também admitiram que os outros dois candidatos não eram aceitáveis. Os membros dos MLS que quiseram apoiar o Sarkozy fizeram-no apenas por uma razão, é todos sabemos que a França está em muito má situação económica e isso influencia a Europa e, portanto influencia o nosso país. O Sarkozy é o único candidato que, a nível económico, é liberal e quer mudar drasticamente a situação em França. No âmbito das liberdades individuais é um candidato conservador, mas quanto à Economia é o candidato que se propõe de facto a mudar alguma coisa em França. Vamos a ver se o consegue.

Já Royal não iria trazer nada de novo e de grandes mudanças à economia francesa e, como tal, aqueles que decidiram apoiar o Sarkozy, não a consideraram uma candidata que devesse ser apoiada. Foi simplesmente essa a razão. Em política tem de se fazer escolhas.

IB: E quanto a esta oposição da França à entrada da Turquia?

MD: Os liberais apoiam a entrada da Turquia na União Europeia e tem sido uma posição os partidos liberais a nível europeu, por isso discordamos de Sarkozy. No entanto, até a Turquia entrar na EU, claramente a Turquia tem de estar preparada para entrar na EU, que ainda não está, ainda há muita coisa que tem de mudar na Turquia e a própria EU tem de se preparar para isso.

IB: Para finalizar, qual pensas ser o futuro da Turquia?

MD: Penso que a Turquia ainda vai passar por alguma turbulência a nível político. As próximas eleições na Turquia vão retirar poder ao actual partido que está no governo e as negociações com a Europa irão continuar ainda durante muitos anos e, se calhar, só daqui a dez ou vinte anos poderemos estar a pensar numa Turquia que possa aderir à EU. Muita coisa há-de mudar na Turquia. A Turquia há-de evoluir economicamente, as pessoas que são emigrantes recentes nas cidades se calhar vão tornar-se menos radicais. O Islamismo também vai mudar, não só na Turquia, mas um pouco por todo o mundo. A Turquia ainda tem um longo caminho a percorrer até poder entrar na EU, infelizmente…

IB: Apesar de ser considerada uma economia muito promissora, com capacidade de igualar países como o Brasil, Rússia, Índia e China. Mesmo apesar disso, tem de ter grandes melhorias. Vinte anos parecem imenso tempo, mas será esse o tempo necessário para que a Turquia possa estabilizar-se?

MD: Antes disso não creio, porque de facto se formos à Turquia, viajarmos por lá, verificamos que as principais cidades estão muito desenvolvidas. Istambul poderia perfeitamente entrar para a EU amanhã, porque é mais desenvolvida do que muitas regiões da Polónia, que já faz parte da EU. Mas existem outras regiões da Turquia em que se vê que é claramente um país em desenvolvimento. Mais as diferenças culturais, e outras muito significativas, estão a causar problemas com a Europa e os problemas que ainda temos a nível de Constituição da Europa, que ainda não foi aprovada… Há muita coisa que tem de mudar para que a Europa possa receber a Turquia e sem medos. Aquilo que se vê na Europa é que há um grande medo por parte de muitas das pessoas que fazem parte da EU relativamente à Turquia.

5.6.07

Entrevista com Miguel Duarte Sobre a Crise Política na Turquia - 1.ª Parte


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IB: Hoje tenho comigo o Miguel Cunha Duarte (MD), Presidente do Movimento Liberal Social (MLS) e o tema escolhido é a Turquia.

No dia 30 de Maio, numa entrevista ao jornal italiano La Stampa, o secretário de estado do Vaticano, Cardeal Bertone revelou que a igreja católica é favorável à entrada da Turquia na União Europeia.
As relações entre o Vaticano e a Turquia têm vindo a evoluir. Em 2004, o então cardeal Ratzinger pronunciou-se contra a entrada da Turquia na União Europeia e, em Setembro de 2006, houve uma crise devido ao discurso do Papa em Ratisbona, durante uma viagem à Alemanha. Já em Dezembro de 2006, o Papa foi à Turquia e rezou na Mesquita Azul de Istambul, num gesto de “amizade e tolerância”. Em Janeiro, o Papa homenageou o “compromisso da Turquia em favor da paz”, lembrando o seu “papel de ponte” entre a Ásia e a Europa e de “cruzamento entre as culturas e as religiões”. E agora o secretário do Vaticano revela a que a igreja católica é favorável à entrada da Turquia.

Qual a interpretação que fazes desta "mudança de atitude" da igreja católica?




MD: Penso que, acima de tudo, devem ser questões políticas. No entanto, recebo de bom agrado essa posição da igreja católica, porque a União Europeia não é um espaço reservado a uma única religião. Deve estar aberta a países de qualquer religião maioritária.

IB: Mas houve uma mudança de atitude…

MD: Fico surpreendido, porque não é do meu conhecimento de que tenha havido qualquer mudança no Vaticano relativamente a este tema.

IB: Tem havido uma crise política na Turquia que está a afectar o processo de entrada na União Europeia.

Fazendo um resumo. Na Turquia a religião predominante é o Islamismo, porém o país é secular, ou seja, existe uma dominação da religião pelo Estado (algo diferente da separação entre Igreja e Estado que temos nos Estados laicos ocidentais), o que afasta a Turquia do resto do mundo islâmico.

No passado dia 24 de abril, o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan anunciou que Abdullah Gul, ministro das relações exteriores, seria o candidato do seu partido (AKP - Partido da Justiça e do Desenvolvimento) à presidência do país. Gul, assim como Erdogan, é um islamista moderado, porém fez questão de afirmar que, caso eleito, seria fiel aos princípios básicos da República, isto é, ao Estado democrático e secular. Contudo, as correntes ultra-secularistas turcas, inclusive nas lideranças militares, levantaram-se contra o apoio do parlamento a um candidato islamista, por considerá-lo antitético ao tradicional secularismo da Turquia e ao legado de Ataturk.

O partido AKP, que chegou ao poder em 2002, rejeitou o seu passado islamista e definiu-se como conservador, porém os seus membros islâmicos desejam que a Turquia abandone as restrições à liberdade religiosa. Dessa maneira, abraçaram um projecto de liberalização do país, defendendo a entrada da Turquia na União Europeia, o livre mercado e as liberdades individuais. Os seus opositores, portanto, que defendem a manutenção do secularismo acabaram por adoptar uma postura anti-Ocidente, anti-liberal e anti-americana.
No dia 27 de Abril, Abdullah Gul não conseguiu votos suficientes para ser eleito presidente da Turquia na primeira volta. Devido a pressões da oposição, a votação foi considerada nula pela corte constitucional. Paralelamente ao desenrolar das questões políticas no parlamento turco, as tensões entre os secularistas e os islamistas moderados alcançaram as ruas em ondas de protestos que envolveram actividades de violência e prisões de centenas de pessoas. Abdullah Gul sucumbiu à pressão dos opositores secularistas e dos militares turcos, renunciando à sua candidatura.

No dia 25 de Maio, o Presidente da Turquia, Ahmet Necdet Sezer, rejeitou a eleição do próximo chefe de Estado por sufrágio universal, reenviando para o Parlamento um conjunto de emendas que incluem essa decisão. As modificações da Lei Fundamental foram preparadas pelo AKP e adoptadas no dia 10 de Maio. Se o Parlamento adoptar outra vez a sua primeira decisão, Sezer não poderá opor-se uma segunda vez, mas pode convocar um referendo.

Portanto, um Estado turco mais “islamizado” seria, à primeira vista, um factor complicador para a integração do país, porém o partido AKP, desde que está no poder, tem feito de tudo para incrementar os laços com a União Europeia e acelerar o processo de admissão da Turquia.

Que consequências a recente crise política turca terá para o processo de entrada na União Europeia? Será que existe actualmente, o risco de quebra da democracia turca, caso os secularistas imponham a sua vontade por outros caminhos que não o das urnas?


MD: A Turquia é um país peculiar e a situação actual é muito complicada. A posição dos secularistas (ou dos laicos, como se diz no resto da Europa) é de que quem islâmico queira tomar o poder, queira dar uma volta na Constituição e queira cortar as liberdades às pessoas. Esse é o grande medo. Sabem que isso não vai acontecer amanhã ou dentro de um ano, mas existe o receio de que lentamente as liberdades vão sendo retiradas.

Existem exemplos de que membros do actual partido que está no governo, em algumas cidades, proibiram o consumo de álcool e tomaram outro tipo de medidas, todas com base nos preceitos islâmicos. Houve uma proposta, que não chegou a ser aprovada na Turquia, devido ao “barulho” que criou, em que se queria tornar o adultério um crime. Isto é algo que para nós, no Ocidente, não é minimamente aceitável.

É evidente que, se este tipo de leis, continuar a ser aprovado, mesmo com o actual partido AKP, a Turquia nunca entrará na União Europeia (UE), porque a UE não vai aceitar que um Estado islâmico, que de facto corte as liberdades individuais, entre para UE.
Por outro lado, é verdade que a Turquia, para entrar para a UE, tem de ser uma democracia sólida. No entanto, o actual sistema eleitoral foi aquele que permitiu que o partido que está actualmente no poder esteja com uma maioria de quase dois terços no Parlamento. É um sistema eleitoral imperfeito, que atribui a um partido que tinha 30 por cento dos votos essa maioria mais do que absoluta. Este sistema eleitoral “corta” a entrada no Parlamento a todos os partidos que não tenham 10 por cento dos votos.

O que se vê na Turquia, neste momento, é luta de forças democráticas, que têm uma visão diferente do futuro da Turquia. A população turca não se sente sequer representada no actual governo e sente-se ameaçada.

Não creio que a Turquia entre na “Europa” nos próximos vinte anos. De uma forma ou de outra será ameaçada. O actual governo turco conseguiu melhorar muito a economia da Turquia e isso é algo positivo e tem tentado implementar muitas medidas impostas pela UE. Aos islamistas estas liberdades são algo que interessa, porque mesmo para eles não há uma grande liberdade religiosa. O Estado controla a religião. Apesar de haver um número enorme de mesquitas, há limitação à abertura de novas mesquitas, à liberdade de expressão de quem fala nas mesquitas.

No entanto, isto não é algo inédito. Em França é o que está a acontecer. O governo francês está a envolver-se na religião muçulmana e a tentar controlar de alguma forma o islamismo radical.

IB: Mas isso, à partida seria bom, não? As pessoas devem ter independência religiosa até certos limites. Quando existe radicalismo e quando as práticas religiosas vão contra as liberdades de cada um, deverão ser controladas. Pensas que essa intervenção do Estado é nociva?

MD: Eu, como liberal, defendo a liberdade de expressão e acho que no mundo ideal o Estado não se devia envolver nos assuntos religiosos. O problema é que temos observado que há, por vezes, uma tendência para o radicalismo e para que este se torne agressivo e perigoso, chegando a implicar actos terroristas.

IB: No caso da excisão feminina houve quem sugerisse que isso passasse a ser feito em hospitais. Por um lado, parece uma coisa completamente aberrante continuar a haver excisão feminina. Por outro, uma vez que previam que isso continuasse a acontecer clandestinamente, que pelo menos fosse feita em condições nos hospitais. Aqui a intervenção do Estado era numa tentativa esses efeitos nocivos que uma prática religiosa teria para cada uma das cidadãs. Elas não são livres de não a fazer, é imposta pela própria religião.

MD: Em relação à excisão sou completamente contra por ser praticada em crianças e não me parece aceitável que possam ser os pais de uma criança a determinar acabar com a sexualidade da sua filha.

IB: Mas só pela forma como é feita é uma coisa completamente bárbara…

MD: Sim, é bárbaro. A excisão feminina é cortar o clitóris a uma mulher.

IB: Sem anestesia.

Continua no próximo programa.

10.5.07

Entrevista com José Maximiano - Portugal de Lés a Lés

O "Portugal de Lés a Lés 2007" será nos próximos dias 12 e 13 de Maio.

É num espírito de preocupação e esforço de sensibilização, que se irá realizar esta primeira travessia ecológica, de Norte a Sul de Portugal, em veículos movidos, exclusivamente, a combustíveis alternativos, ecológicos e renováveis, como é o caso do óleo vegetal e do biodiesel.

Esta iniciativa insere-se no projecto Fórum NOVAENERGIA.NET, criado por alguns cidadãos preocupados, essencialmente, com as questões ambientais emergentes.

É um projecto sem fins lucrativos, que tem fomentado principalmente a cooperação entre a sua comunidade de membros, que já ultrapassa os 1200. São promovidos, o conhecimento e a troca de experiências, sempre com o intuito de chegar a soluções energeticamente eficientes e mais ecológicas.

São debatidos inúmeros temas, sendo de destacar o uso de óleo vegetal directo e o fabrico de biodiesel, como combustíveis, sem esquecer o álcool etílico e metílico. Outras áreas, tais como a eficiência energética em habitações, a energia eólica, a energia solar e foto voltaica e a energia da biomassa, são igualmente debatidas, sempre com o objectivo de desenvolver o conhecimento de uma forma acessível e gratuita, para quem o quiser assimilar.

Esta iniciativa acontece também no seguimento da apresentação pela ONU, no dia 2 de Fevereiro, do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (I.P.C.C) e da imposição que a Comissão Europeia apresentou à indústria automóvel no sentido de reduzir em 25% as emissões de dióxido de carbono (CO2).

Esta iniciativa visa ainda sensibilizar os governos, os automobilistas e a população em geral, estimulando o uso de combustíveis limpos e amigos do ambiente.

A caravana ecológica iniciará o percurso em Bragança, com destino a Quarteira, onde terminará com a participação na Exposição Veículos Amigos do Ambiente / Cozinhas Solares.

Entrevistei José Maximiano, um dos organizadores.


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Itinerário:

Bragança - Guarda - Castelo Branco - Portalegre - Évora - Beja - Quarteira.

Programa do PORTUGAL DE LÉS A LÉS ECOLÓGICO

Inicio em Bragança.

DIA 11 DE MAIO

Concentração junto à Câmara Municipal de Bragança pelas 19 horas. Volta pela cidade em passeio turístico.
Jantar e dormida.

DIA 12 DE MAIO

Início às 8 horas, com a caravana Junto à Câmara Municipal, rumo à Guarda.

Chegada às 11 horas. Concentração na Câmara Municipal da Guarda e almoço.

Ida ao centro de inspecção e, perante sorteio, análise dos parâmetros no opacímetro de um dos veículos participantes.

Partida às 16h30 com destino a Castelo Branco.

Chegada às 17h30. Visita à Câmara Municipal.

Partida às 18h30 com destino a Portalegre.

Chegada às 19h30. Concentração junto à Camara Municipal de Portalegre.

Jantar e dormida em Estremoz.

DIA 13 DE MAIO

Partida às 8 horas com destino a Évora.

Chegada às 10 horas. Visita à Câmara Municipal de Évora

Partida às 11 horas com destino a Beja.

Chegada às 12 horas. Concentração junto à Camara Municipal de Beja

Almoço às 13 horas.

Partida às 15 horas com destino a Quarteira.

Chegada às 17 horas.

Participação na Exposição de Novas Energias.

Jantar às 20 horas.

Final do evento.


Mais informação em:


novaenergia.net

Contactos:

José Maximiano
919688842

José Manuel dos Santos Alves
967934762

9.5.07

Entrevista com Daniel Burrueco sobre El Club Literario

A propósito do Dia Mundial do Livro, entrevistei Daniel Burrueco. O Daniel vive em Portugal, trabalha com software informático há muitos anos e resolveu criar um site dedicado à leitura. Trata-se do Club Literário (www.elclubliterario.com).

Ali são apresentadas dez sugestões de livros e a finalidade é a escolha e leitura de um por mês. No site, os livros são depois discutidos. Por enquanto, ainda é espanhol!


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Este programa foi para o ar na semana de 30 de Abril.

30.4.07

Transcrição da Entrevista com Helena de Sousa Freitas - Sigilo Profissional em Risco

Esta entrevista já foi colocada em dois posts anteriores.
No entanto, devido a que a audição esteve indisponível durante algum tempo, coloco agora a transcrição da entrevista, na íntegra.

IB: Hoje entrevistarei Helena de Sousa Freitas, autora do livro “Sigilo Profissional em Risco”.


O livro retrata a polémica condenação do jornalista Manso Preto, que, ao abrigo do sigilo profissional, em 2002 se recusou a revelar ao tribunal a sua fonte, numa peça sobre tráfico de droga. Entre outras coisas, o livro analisa também processos similares, envolvendo jornalistas portugueses e estrangeiros.


Helena, o sigilo profissional dos jornalistas estará mesmo em risco? Porquê?


HSF: Eu considero que sim, que está mesmo em risco, porque, de acordo com a investigação que eu fiz, nos últimos anos tem vindo a registar-se, cada vez mais, talvez devido à guerra ao terrorismo, do pós Onze de Setembro, o uso de escutas, vídeo-vigilância, buscas nas redacções e intercepção postal, inclusivamente (conhecida por violação de correspondência). Isto em todo o Mundo, afectando dezenas de jornalistas nos mais diversos países. Estamos a falar desde Estados Unidos, que tem tido os casos mais mediáticos, mas também Reino Unido, Irlanda, Paraguai, Austrália, Bélgica, Canadá, Etiópia, Nepal, França. Tem afectado jornalistas um pouco por todo o Mundo. Ao todo, dos números que eu consegui recolher, praticamente uma centena, pelo menos.


IB: Em que medida é que isto pode afectar o jornalismo de investigação?


HSF: Eu penso que pode afectar o jornalismo de investigação, na medida em que as fontes começam a ter receio de falar com os jornalistas. Este tipo de medidas, de escutas, de intercepção postal, de buscas, acaba por inspirar medo, sobretudo nas fontes e, sem fontes confidenciais, não há jornalismo de investigação em áreas como a política, como a economia, como a justiça, como o crime. Isto porque são áreas em que, por vezes, é preciso pegar em assuntos muito delicados, em matérias muito sensíveis e as fontes só podem falar com os jornalistas se souberem que não vão ter de dar o rosto, que não vão ter de dar o seu nome. Muitas vezes isto significa não só risco de perder o emprego, mas também perigo de vida, quer para a fonte em si, mas também para familiares, para pessoas das suas relações. É isto também que o sigilo das fontes procura salvaguardar, que as pessoas possam falar sem sofrer represálias pelos factos que apresentam ou que fazem chegar aos jornalistas.


IB: O principal caso que é apresentado no livro é o do jornalista Manso Preto.


Só para dar um enquadramento, já que para a classe jornalística é sobejamente conhecido, mas para o público em geral pode não ser, apresento um resumo:


“Este caso teve início quando o jornalista Manso Preto, na sequência de reportagens sobre civis infiltrados pela polícia judiciária em redes de tráfico de droga, que publicou no semanário Expresso no início de 2002, foi arrolado como testemunha pelo advogado de defesa dos irmãos Jaime e Mário Pinto. Estes camionistas ficaram conhecidos por terem liderado o bloqueio contra o aumento do preço das portagens na ponte 25 de Abril, em 1994. Depois foram envolvidos num caso de narcotráfico, do qual terá resultado, em Outubro de 2000, a apreensão de quatro toneladas de haxixe. Os trabalhos publicados pelo jornalista punham em causa a fronteira entre as acções infiltradas legalmente e as acções infiltradas provocadas. Estas últimas são proibidas por lei e já conduziram à inutilização de provas e, consequentemente, à anulação de julgamentos e absolvição dos arguidos.


O advogado dos irmãos Pinto, alegando que estes tinham sido alvo de uma cilada por parte da PJ, considerou que o jornalista, pelos conhecimentos que demonstrava nas reportagens podia dar um testemunho valioso e foi aí que o arrolou como testemunha.


O jornalista Manso Preto foi testemunhar no processo, em 2002, e é nessa altura que ele acrescenta que um inspector da PJ, entretanto aposentado, mas que à data exercia funções de chefia no departamento de combate ao tráfico de droga, o informara que o caso dos irmãos Pinto era uma encenação, uma acção provocada pela PJ de Setúbal, como tantas anteriores.


Foi perante afirmações destas que a magistrada quis conhecer o nome desse tal inspector, mas o jornalista recusou-se a dizer.


Perante a manutenção da recusa, o jornalista viria a ser condenado a onze meses de prisão com pena suspensa por três anos. Manso Preto não chegou a cumpri-los, mas foi sensivelmente esse o tempo que esperou pela resposta ao recurso da sua defesa e na sequência do qual foi absolvido do crime de desobediência, em 2005.”


Portanto, é aqui que entra o sigilo profissional. O jornalista Manso Preto decidiu optar por proteger as fontes. Neste caso, e em todos os casos de sigilo profissional, isto é um direito ou é um dever do jornalista?


HSF: É um direito e é um dever. Como direito está consagrado na Constituição, é o artigo 308.º. Está também consagrado na Lei de Imprensa, é o artigo 302.º. E, nos Estatutos do Jornalista, era o artigo 6.º (agora com as alterações, não sei se ficará com o mesmo número).


Como dever, figura no Código Deontológico dos Jornalistas, é o ponto 6.


Portanto, ele tem estas duas características, de ser um direito e de ser um dever. Por vezes, ouve-se falar que é apenas um dever e que, portanto o jornalista pode ter de ceder com mais facilidade, porque o que está inscrito na Lei são direitos. Mas, neste caso, ele é também um direito. Pessoas que surgem com este argumento (de que é somente um dever) não têm conhecimento. É um direito e está salvaguardado a três níveis (Constituição, Lei de Imprensa e Estatutos do Jornalista).


IB: Um dos principais factores que leva os jornalistas a quebrar o sigilo profissional é o segredo de justiça (e foi neste âmbito que, no caso Manso Preto, foi levantado o sigilo profissional). Não se estará a utilizar os jornalistas, não só neste caso, mas em todos os casos onde isso acontece, como instrumento auxiliar à investigação, em vez de ser o próprio aparelho judicial a fazer essa mesma investigação?


HSF: No caso do Manso Preto eu já o tenho dito e continuo convicta disto, acho que a justiça quis poupar tempo e esforço e explico por que é que tenho esta posição. Porque o Manso Preto, exceptuando o nome do ex-inspector da Polícia Judiciária, deu um manancial enorme de informação. Ele disse que era um ex-inspector que estivera na chefia do combate ao narcotráfico em Setúbal. Ora, perante todas estas informações, quantas pessoas é que caberiam neste perfil. Eram três, quatro, cinco no máximo. Não estou a ver mais do que isso. Portanto, se a questão era também chamar essas pessoas a tribunal como testemunhas, tal como ele também foi arrolado, e ninguém se pode furtar a comparecer a uma situação dessas, logo poderiam ouvir o que os vários inspectores, que correspondiam a este quadro de características, tinham a dizer. Por exemplo, esta era uma opção. Por que é que o Manso Preto tinha de falar? Portanto, houve aqui um certo “braço-de-ferro”.


IB: Quando um tribunal pondera a necessidade de quebra de sigilo profissional dos jornalistas, pelo menos nos casos apresentados no livro, pede sempre um parecer ao Sindicato dos Jornalistas. Não é óbvio que o Sindicato se vai sempre pronunciar desfavoravelmente à quebra do sigilo profissional?


HSF: Em todos os casos que eu encontrei no meu período de estudo, o Sindicato pronunciou-se contra a quebra do sigilo, em todos eles. Mas eu acredito que um dia ele possa tomar outra posição, dependendo do caso em questão.


Tentei perceber por que é que isto acontecia, quando fui consultar a documentação e vi que o Sindicato se tinha sempre pronunciado contra. Também falei com pessoas do Sindicato acerca disto e a conclusão a que cheguei foi que a posição do Sindicato se deve ao facto de esta entidade achar que a relação de confiança entre a fonte e o jornalista só deve ser quebrada em caso de muita gravidade e após esgotadas todas as hipóteses de chegar às fontes por outros meios. Aliás, é até o que está previsto na Lei. O jornalista será instado a revelar a fonte só mesmo se não houver nenhuma outra possibilidade de se chegar à fonte por um outro caminho.


A conclusão a que me parece que o Sindicato chegou é que não tinham sido feitos todos os esforços para se chegar a essa informação sem ter de colocar o jornalista a falar e daí se ter sempre pronunciado contra a quebra do sigilo.


IB: E neste caso específico?


Para mim, num caso como o do Manso Preto, parece-me flagrante que houve uma falta de investimento num caminho alternativo. Houve uma grande insistência em que o Manso Preto falasse e uma insistência menor em encontrar um caminho alternativo para chegar à fonte. No caso dele é flagrante, porque me parecia bastante fácil conseguir ir, pelo menos, por um trilho alternativo. Tentar esse caminho! Não insistir com o Manso Preto com uma insistência que se prolongou. Ele foi várias vezes instado a falar. Perguntaram-lhe se não queria mudar a posição dele, se ele já tinha pensado bem. E ele disse sempre que não, que não dizia.


IB: Os jornalistas têm essa função social de fazer chegar a informação à comunidade. Como é que o levantamento do direito à protecção das fontes, do sigilo, pode pôr em causa o acesso do público à informação? De que forma é que poderá haver uma imprensa livre se as fontes não puderem confiar nos jornalistas?


HSF: Não pode existir uma imprensa livre e aí é que o problema se coloca. Para mim, o aspecto mais grave da questão é, precisamente, esse. Se as fontes não puderem falar com os jornalistas por receio de que o jornalista, pressionado pelo tribunal, revele o seu nome, se souberem que há este risco, o jornalista acaba por não ter acesso a determinadas informações, sobretudo em dossiers mais delicados. O público sai, assim, como o principal perdedor no final dessa cadeia. A fonte retrai-se, porque tem medo de um dia ser revelada, e não dá informação; o jornalista não tendo acesso, não divulga, e quem perde no final disto tudo é o público, que é o destinatário final da informação.


O jornalista é apenas o intermediário, ele não quer a informação para si, quer informação para divulgar. A partir do momento em que o primeiro elo da cadeia se corta ou deixa de existir, que é a tal revelação da informação ao jornalista, o jornalista não tem o que informar e o público não recebe informação.


IB: O jornalista fica então numa posição muito difícil… No caso descrito no livro, da jornalista americana Judith Miller, ela no início teve o apoio até da comunidade internacional, por não ter revelado as fontes. Após a sua libertação (ela foi mesmo presa) chegou a ser acusada de desenvolver trabalho ao serviço das fontes e da agenda política norte-americana. Como é que um jornalista pode ou deve lidar com uma situação destas. Por um lado, tem de proteger a fonte, por outro, tem de defender a credibilidade da sua classe e, por outro, tem de obedecer à justiça?


HSF: Aqui, as duas primeiras, ou seja, o jornalista ter de proteger a fonte e defender a credibilidade da classe, penso que se podem interligar. De certa forma, ao proteger uma fonte confidencial, o jornalista está a defender a credibilidade da sua classe. O contrário seria se ele falasse, porque aí não era só ele que era prejudicado. Passava a ser visto como um delator e, provavelmente, era o fim da sua carreira. Estaria a pôr em risco a confiança geral do público e de eventuais fontes na classe, como um todo. Portanto, a credibilidade ficava mais em risco se, no caso de Judith Miller, tivesse divulgado uma fonte que lhe tinha pedido o anonimato. Aqui a protecção da fonte, de certa forma, também defende a credibilidade da classe.


O que pode sempre acontecer, e aconteceu no caso dela, é que ocorreram ataques, suspeitas, que, a partir do momento em que o jornalista prefere o silêncio, terá sempre de suportar. Até uma certa maledicência, porque às vezes a coragem também incomoda. São consequências que um jornalista tem de carregar se optar pelo silêncio. Por um lado, eu acho que ele está a prestigiar a classe, por outro lado, é claro que dentro da classe e fora dela podem sempre levantar as questões de “Por que é que ele não fala? Será só uma questão de preservar o anonimato e de manter essa relação de confiança ou há algo mais que o jornalista está a ocultar, a esconder?”. Isto é algo com que o jornalista vai ter de lidar, se optar por manter o silêncio. Assim como, se decidir falar, há certamente outras avaliações que vão ser feitas. “Por que é que falou? Por que é que não guardou o sigilo? Já sabia que, quando prometeu o sigilo, um dia poderia ser instado pelo tribunal. Não pensou nisso na altura?”. Portanto aqui, coitado, “seria preso por ter cão e preso por não ter”, que até é uma expressão que o Manso Preto utiliza.


IB: E para conciliar as três situações?


Já mais difícil é conciliar a protecção das fontes, com a credibilidade da classe e com o obedecer à justiça. Sobretudo, se a justiça não for sensível aos direitos dos jornalistas e, por vezes, o que me parece que acontece é que o direito ao sigilo profissional, apesar de estar consagrado na Constituição, na Lei de Imprensa e nos Estatutos dos Jornalistas nem sempre terá um grande peso no âmbito judicial, quando os juízes têm de avaliar determinadas situações que envolvem jornalistas.


IB: Para finalizar, um dos fenómenos que foi abordado no livro é um relativamente recente, que é o dos bloggers. Sendo uma realidade nova, como é que se pode garantir aqui a protecção das fontes? Porque num blogue pode escrever-se o que se quiser. Dever-se-á criar um estatuto do blogger, à semelhança do dos jornalistas?


HSF: Este é um bom tema para debate. Eu gostei especialmente de escrever este capítulo do livro. Nós, em Portugal, temos uma imprensa livre. O jornalista pode cumprir as suas funções. As funções do jornalista não estão em causa em Portugal e, por isso, eu penso que, em Portugal, esta questão dos bloggers terem o mesmo estatuto dos jornalistas, o mesmo direito à protecção das fontes, talvez não se coloque. Se temos um jornalista que faz essa função, passarmos a ter um blogger com o mesmo estatuto, eventualmente levantava problemas aos profissionais que exercem o jornalismo e, provavelmente, junto do público não seria muito bem recebido.


Mas eu quis avançar com esta questão, sobretudo, porque, como estive a fazer o estudo também no plano internacional, chamou a minha atenção situações como existem, por exemplo, no Irão, na China e noutros países, em que os jornalistas estão, de certa forma, amordaçados. E o que acontece aí? Acontece que há bloggers que acabam por assumir a função que caberia aos jornalistas, se estes pudessem trabalhar livremente. É, sobretudo, em relação a estes países que me parece importante ponderar, dar algo mais aos bloggers. Dar-lhes talvez um estatuto mais próximo daquele que os jornalistas têm num país livre. Isto porque, de certa forma, eles acabam, em certas circunstâncias, por fazer as funções dos jornalistas, porque não há uma liberdade de imprensa.