20.4.11

Resumo “Identidades Assassinas” de Amin Maalouf (1998) – Segunda Parte

No segundo capítulo, intitulado “Quando a modernidade vem do outro”, Amin Maalouf começa por colocar diversas questões, que julga serem comuns à maioria das pessoas, relacionadas com o mundo árabe: porquê o véu, porquê o arcaísmos e a violência, será tudo isto inerente a estas sociedade, será o Islão incompatível com a liberdade e com a democracia?

Relativamente a este tema, se, por um lado, não agrada ao autor o discurso feito de velhos preconceitos relativamente ao Islão, em que são tiradas conclusões definitivas relativamente a certos povos e à sua religião; por outro, também não lhe satisfaz o discurso daqueles que dizem que a religião muçulmana é a religião da tolerância e que tudo não passa de um mal-entendido.

Maalouf vai mais a fundo neste último ponto de vista e diz que, mesmo que uma doutrina não possa ser considerada responsável por algum acto repreensível cometido em seu nome, ela não pode, no entanto, ser considerada como totalmente estranha a tal acto. Consoante a interpretação que cada um faz da sua doutrina, assim a pode utilizar de determinada forma:

“Todas as sociedades humanas souberam encontrar, no decurso dos séculos, as citações sagradas que pareciam justificar as suas práticas do momento …. O texto não muda, o que muda é o nosso olhar. Mas o texto não age sobre as realidades do mundo senão através do filtro do nosso olhar. Olhar que em cada época se demora sobre certas frases e desliza por outras sem as ver”.

Dá o exemplo do “Não matarás” da Bíblia, que só passados dois ou três mil anos começou a ser aplicado à pena de morte (e não é em todo o lado, como se sabe). Será então o cristianismo tolerante, respeitador das liberdades, conducente à democracia? Se olharmos para a Inquisição, escravatura, sujeição das mulheres, factos que ocorreram ao longo de séculos, dir-se-ia que não. Então por que é que só no século XX o espírito democrático do cristianismo se revelou? O autor explica que esta exigência de democracia não foi algo que sempre tivesse existido na história do mundo cristão, mas, apesar de tudo, a democracia conseguiu instaurar-se nas sociedades de tradição cristã, embora de forma progressiva, incompleta e tardia.

Maalouf chama a atenção para que nenhuma doutrina é necessariamente libertadora e para que, se sobre estas questões quisermos deitar um olhar novo e útil, será necessário que não haja nem hostilidade, nem complacência, nem, sobretudo, condescendência.

O autor faz então uma pequena retrospectiva da história do Islão. Cinco anos após a morte de Justiniano, em 565, e a queda do Império Romano, nascia Muhammad Maomé. Este vazio deixado pela “grande Roma” permitiu, entre outras coisas, que as tribos da Arábia conseguissem, em algumas dezenas de anos, tornarem-se senhoras de um imenso território que ia de Espanha até às Índias. Tudo isto, diz o autor, de forma espantosamente ordenada, com um relativo respeito pelos outros e sem excessos de violência gratuita.

Esclarece então que percebe que servirá de pouca consolação saber que o Islão foi tolerante no século VIII, quando hoje se cometem crimes em seu nome. No entanto, o que o autor pretende não é defender nem o Islão, nem o Cristianismo. Aquilo por que se bate é contra a ideia de existência de uma religião – a cristã - que sempre defendeu o modernismo, a liberdade, a tolerância e a democracia, e outra – a muçulmana – votada desde sempre ao despotismo e ao obscurantismo. Diz o autor que isto é errado, é perigoso e ensombra toda a perspectiva de futuro de uma boa parte da humanidade. Aos seus olhos:

“Um crente é simplesmente aquele que crê em certos valores – que resumirei num único: a dignidade do ser humano”.

Nenhuma religião está desprovida de intolerância e o autor não pretende julgar ninguém, limitando-se, segundo ele, a constatar que houve no decurso da história muçulmana uma longa prática de coexistência e de tolerância a outras religiões. Porém, acrescenta:

“A tolerância não me basta. Não tenho desejo algum de ser tolerado, exijo que me considerem um cidadão de corpo inteiro, qualquer que seja a minha crença.”

Ao fazer a comparação entre os dois mundos, o cristão e o muçulmano, talvez se pudesse descobrir de um lado uma religião intolerante durante um longo tempo, que se transformou numa religião de abertura, de outro, uma religião que possuía uma vocação de abertura, mas que derivou para comportamentos intolerantes e totalitários. A questão, para o autor, está em saber por que tal aconteceu, ou seja, por que razão o ocidente cristão conseguiu produzir sociedades respeitadoras da liberdade de expressão, enquanto o mundo muçulmano aparece agora como uma “cidadela do fanatismo”.

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